sábado, 26 de novembro de 2011

Pró-Archia ou Pró-Cícero (fim de cap.)

O que me surgiu como mais curioso foi verificar que a sua presença se tornou uma "constante imperiosa na côrte dos Príncipes de Avis."(31) De facto, "De Officciis" (ou livro dos deveres) foi traduzido pelo Infante D. Pedro, que dedicou a obra ao seu irmão, o Rei D. Duarte, que irá utilizá-lo em alguns dos capítulos do seu "Leal Conselheiro" e o citará como mestre de arte retórica. Numa das suas obras, é mencionado também o "Sonho de Scipion, o Africano."(32)Talvez prenúncio das preocupações do Rei D. Duarte com as descobertas e a expansão portuguesa.
Ainda da casa de Avis nos chegam ecos da dialéctica ciceroniana em torno da amizade, no "Prólloguo do IV Nobiliário,"de D. Pedro, Conde de Barcelos, estabelecendo os limites e deveres da afeição: "E os amigos verdadeiros devem-se guardar em sas palavras de dizer cousa per que seus amigos nom venham a fama ou a mal, ca per i se desataria a amizade. e nom se devem mover a crer de ligeiro as cousas que lhes deles digam de mal e devem-se guardar segredos e nom devem retraer as obras que se fizerem."(33) Seria também "na fundamentação das afeições" que Cícero é citado por Fernão Lopes, no "Prólogo da Crónica de D. João I": 'E assi parece que o sentiu Túlio, quando veio a dizer: Nós não somos nados a nós mesmos, porque uma parte de nós tem a Terra e outra os parentes',"(34)
Sabemos ainda que "na Renascença, o entusiasmo por ele foi ilimitado. No séc. XVII, os seus discursos foram estudados a sério e a sua leitura era recomendada aos pregadores."(35) Também, e inevitavelmente, Camões era leitor de Cícero, e «Os Lusíadas» isso refletem, pois,tal como ele, refere Homero e as várias cidades que o queriam como seu cidadão:

Esse, que bebeu tanto da água Aónia,
sobre quem tem contenda peregrina,
entre si,Rodes, Smirna, e Colofónia,
Atenas, Io, Argo e Salamina.

(canto V, 87,1-4)

E é visível "a influência de Cícero em Rodrigues Lobo, no seu livro «A Corte na Adeia.» (36)
Seria difícil de enumerar toda a importância que a obra deste grande orador e literato teve ao longo dos tempos. Na verdade, nasceu em 106 a.C. e teria por volta de 44 anos em 62 a.C., quando fez a defesa de Archia. Naturalmente que toda a sua formação espiritual e política-filosófica estava solidamente estruturada. Por esse motivo, penso que toda esta dialéctica ciceroniana em torno da amizade, - que tanto veio a influenciar a literatura dos séculos XVI, XVII e XVIII -, já estava presente na sua formação quando o orador se dispôs à defesa de Archia, creio mesmo que mais do que uma presumível obra que este poeta lhe prometera em louvor do seu consulado. Só realmente Cícero, que em tão alto grau tinha a amizade, a cultura, e a poesia, se proporia a fazê-lo.

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