quinta-feira, 19 de julho de 2012

Cartas Familiares de Cavaleiro de Oliveira

Mártir quer dizer testemunha...
Ortega Y Gassett

II

Corria o ano de 1702, tinham-se festejado as Maias e as giestas e outras flores disputavam entre si a beleza e a graça, nos mais variados tons e odores, quando nasceu, em Lisboa, Francisco Xavier de Oliveira. Passavam dois meses que se tinha iniciado a Primavera; ia no auge, transbordando em alegria como que a pôr-se de acordo com a felicidade daquela mãe, D. Isabel da Silva Neves.
Reinava D. Pedro II, e iniciava-se a Guerra da Sucessão de Espanha, em que Portugal irá tomar parte. Fundava-se a Casa dos Quintos, no Rio de Janeiro, onde era fundido o ouro em pó. Tinha quatro anos quando começa o reinado de D. João V, o Magnânimo. É sob ele que vai viver até partir para a Holanda. Tal como este período histórico de esplendor e miséria, Oliveira encarnaria estes dois subarquétipos: um, culto, eloquente, educado, cavalheiro; outro contundente, "fútil", convincente, e versátil. Ele próprio confessará:
"Conheço os meus defeitos e não quero emendar-me (...) rebelde à autoridade da minha razão, obro directamente contra as suas ordens. (...) Não posso deixar de lamentar a minha triste sina! (...) A minha melancolia procede (...) da irregularidade dos meus afectos." (1)
Camilo Castelo Branco, segundo Aquilino, "descobriu nele o seu irmão na sina de sofrer como o era já na arte de rir dos absurdos e necessidades do próximo;" (2) porque, acrescenta, "nenhum escritor português arrastou cruz mais pesada" (2) nem a "fortuna e a desgraça se revezaram com mais ardor a deprimir e a exaltar." (2)
Talvez pela cruz que arrastou, ele se tenha tornado uma estrela no firmamento histórico da nossa literatura. -Fonte para os nossos grandes escritores como Camilo, Garrett, Oliveira Martins, Aquilino e outros - Porém, apesar dessa cruz, as flores de Maio, margaridas do monte, açucenas, rosas e puros lírios, suavizaram-lhe os dias quando ele as deslumbrava com a sua melodia, "qual avena de sátiro pelos bosques." (2)
Seu pai, José de Oliveira e Sousa e sua mãe, frutificaram numa prole de mérito. Um seu irmão era frade beneditino, e outro missionário no Brasil e uma irmã, que faria um casamento rico, com "Araújo Banha, guarda-roupa do infante D. Pedro." (2) Tinha o autor uma herança fidalga, de que muito se orgulhava e a que irá fazer referência nos seus escritos:
"Todos os nobiliários do reino, histórias nacionais e estrangeiras são unãnimes quanto à nobreza da minha estirpe." (2)
O seu sangue era português como vem a provar "a sentença que pronunciou contra ele o Santo Ofício" (2)
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Notas:
(1) RIBEIRO, Aquilino, O Cavaleiro de Oliveira, Colecção "Ontem e Hoje", Livraria Lelo, Ld., Editora, s/d. pp. 7,8,9,16,17,94.
(2) Idem, Introdução.
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(Continua) 

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