ARTE
POETICA
PARTE PRIMEIRA
(Continuação)
Em fim outras Lambentes se apelidaõ,
Porque os toques da língua as constituem
He o L a melhor: o N he docil:
He expressivo o T: o D flexível:
He o R indomável, e terrivel:
O S sibilante, e o Z formado
De hum tinido mais brando, e delicado.
Das vogais a mais clara, e mais aberta
He o A, e com ella a nossa Infância
Articûla a primeira consonância:
He o O varonil, e sonoroso,
Muito menos o E, o I confuso,
E o U, com hum estrondo mais molesto,
He sempre triste, insípido, e funesto.
Depois que conheçais a differença
De humas a outras letras, empenhai-vos
Em formar a eloquencia das mais doces,
Mais claras, mais harmónicas, e o effeito
Alcançareis bem cedo no proveito,
Que esta escolha vos da: Inda que o metro
He todo numeroso, se lhe observa
Hum numero tão fino, que se sente
Melhor, do que se explica, e mais luzente
Com esta escolha, e ordem das palavras
Se nos mostra: já Aristoteles dizia
Hum pedante, que nunca percebia
O numero do Verso, nem da Prosa:
Usai só (respondeo o Sábio Mestre)
De hum corpo taõ immovel, e taõ rudo,
Que inculca neste inerte desalento,
Que não tem eleição nem sentimento.
A belleza do Verso acompanhada
Ha de ser da doçura, e das imagens,
Que se chamaõ patheticas, notando
Os affectos humanos, e exprimi-los
Com tão forte calor, como se ouvî-los
Pudesse o coração: o espanto, e o susto,
A alegria, a tristeza, a dor, e a anciã
Tão vivas se haõ de pôr na consonância,
Que os ouvintes recebaõ nos affectos
A mesma commoção destes objectos.
Talvez direis que hum caso lastimoso
Nunca póde ser doce, ou deleitoso;
Assim he se o exemplar se offrece à vista;
Porém quando se finge na cadencia,
Alcança commummente o nosso agrado
A destreza de o vermos imitado.
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(continua) p. 12
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