quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

«O Tempo, protagonista da Poesia Barroca»

O fim do século XVII, e o século XVIII, assiste a "um verdadeiro renascimento da retórica", o gosto estilístico da linguagem acompanha todo o esplendor de uma época áurea, em que se assiste ao "levantamento de arcos triunfais e outras construções, em materiais perecíveis ou duradoiros, para assinalar acontecimentos festivos ligados com a vida dos povos e em especial dos seus governantes." (1) Arcos de Triunfo que, à semelhança da antiguidade clássica, principalmente da civilização Romana, se erguiam como "a mais alta honra" que se podia prestar a um chefe militar, - de que foi exemplo a entrada triunfal, em Roma, de Cipião, O Africano -, atingiam o seu "apogeu na época moderna."
"Da entrada de Filipe III em Lisboa, em 1619, conhecemos a magnificência das ornamentações, através das 14 belas gravuras inseridas no livro de Lavanha. (2) (...) O próprio Filipe III se maravilha com tudo isto, sentindo-se alcançar a dimensão que faltava ao seu reinado decadente mas dourado. (...) Mais arcos de triunfo e outros aparatos se construíram em 1622, quando os jesuítas celebraram com grande espectacularidade a canonização de Santo Inácio de Loiola e S. Francisco Xavier, e em 1662, para festejar o casamento da infanta D. Catarina com Carlos II de Inglaterra."
"Celebres ficaram os arcos que a cidade de Antuérpia erigiu para a entrada do cardeal-arquiduque Fernando (17 de Abril de 1635), desenhados e dirigidos na sua  construção por Rubens, em que a inspiração deste artista se soltou numa arquitectura rica de fantasia, movimento e gosto pictórico, adaptadíssima a este género de construções efémeras e decorativas. Ainda existe a tela de um desses arcos, O Triunfo de Fernando, hoje na galeria florentina dos Uffísi." (3)
"A pintura a fingir pedras raras aparece já nos arcos de 1581, da entrada de Filipe II. Pode-se dizer que foi através de todas estas construções efémeras que os artistas portugueses desenvolveram a extraordinária habilidade de pintar pedrarias que se torna uma das características mais notáveis dos retábulos de talha da época pombalina." (4)
Portugal mostra ao resto da Europa o máximo apogeu desta arte, durante as cerimónias do segundo casamento de D. Pedro II, que se irá repetir, mesmo que sem a  mesma pompa e circunstância, no enlace de D. João V e de D. José I. Arquitectos como Matheus de Couto, ou Luís Nuno Tinoco, participaram destas construções, assim como vários dos nossos pintores.
Bento Coelho, que se formou em contacto com a pintura desta época, deu contributo, possivelmente, a  todas estas manifestações, visto que a par de Reinoso, Avelar Rebelo, Domingos da Cunha e Diogo Pereira, era expoente na sua arte. Ele "foi o pintor português que melhor soube receber a lição de rubenismo para a adaptar às necessidades locais, tendo grandemente contribuído para a definição duma modalidade de decoração do espaço eclesiástico, típica dos finais do século." (5) "Dois aspectos da Sala do Despacho do convento de Nossa Senhora da Quietação (Flamengas), no largo do Calvário, em Lisboa, são-lhe atribuídas. A sala, pela sua decoração em azulejo, talha e pintura, apresenta-se como um espaço barroco afim da concepção da Igreja «toda forrada a ouro», já que o próprio tecto prolonga o revestimento de pinturas. O tema é novamente o da vida de Cristo e da Virgem, como foi norma durante este período. (...) A coroação da Virgem é a composição que ocupa a zona central do tecto, funcionando como a chave de todo o conjunto. (...) O movimento em turbilhão luminoso dos pequenos anjos oferece talvez o sinal de intenção barroca mais declarada, complementar do tom dramático e teatral das restantes telas." (6) Este "artista será nomeado pintor régio em 1678, sucedendo no cargo a Domingos Vieira." (7)
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p.2 (continua)
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Notas: 
(1) BORGES, Nelson Correia,  A Arte Nas Festas do Casamento de D. Pedro II, Paisagem Editora, Porto, pp.81. (2) Idem, pp.93. (3) Idem, pp.91. (4) Idem, pp.105.
(5) SOBRAL, Luís de Moura, Pintura e Poesia Na Época Barroca, Editorial Estampa, Lda., Lisboa, 1994, pp.23. (7) Idem, pp.22.
(6) MOURA, Carlos, História Da Arte Em Portugal, Publicações Alfa, Lisboa, 1993, pp.143. 

sábado, 22 de dezembro de 2012

«O Tempo, protagonista da Poesia Barroca»

"Es luz, que passa, y flor que se marchita"


INTRODUÇÃO

«A linguagem da poesia barroca»

I

Teremos que recuar às antigas Poéticas de Platão, Aristóteles e Horácio para melhor compreender a linguagem da poesia barroca. Mas a Poética explicará, por si só, toda a riqueza deste "estilo inconfundível marcado por excessos tanto temáticos, como formais?" Cremos que não. A "poesia (barroca) é resultado de um inefável equilíbrio fonético que ecoa uma retórica tão leve que parece não atingir dimensão nem estar assente em referentes concretos organizados." Esse inefável equilíbrio" terá sido conseguido porque a Retórica  de Aristóteles se aliou às Poéticas para encaminhar os estudos dos nossos poetas, o que permitiu o uso de uma linguagem culta e um estilo que marcou, incontestavelmente, um tempo e um espaço, com "referentes concretos organizados."
Os estudos retóricos fizeram-se, mesmo que incipientes, desde os tempos medievais, como atestam as obras presentes nas livrarias dos mosteiros de Alcobaça e de Santa Cruz de Coimbra. Segundo Joaquim de Carvalho: "O sermão medieval foi uma composição que obedeceu a regras e preceitos, distante da prédica simples das primeiras gerações cristãs e das rajadas eloquentes do século XVII e dos que se lhe seguiram." Em 1432 a retórica era uma cadeira incluída no programa de estudos da Universidade de Lisboa e o próprio Infante D. Henrique, legou em testamento uma verba para que esse ensino continuasse.
Os rudimentos da retórica aprendiam-se no século XVI em todas as escolas e, em 1559, a Universidade de Coimbra tem como obrigatórias, na licenciatura em Artes, as cadeiras de gramática e retórica. Isso vai possibilitar o melhor conhecimento dos autores clássicos. Cícero, Horácio, Quintiliano, Séneca-o-Rector, Virgílio, Homero, e tantos outros, como Tasso, Dante ou Petrarca, preparam uma cultura sólida, sobre a qual irá assentar a "transgressão" da linguagem, na época barroca, marcada pela grande dúvida do "eu". A. Salgado Nunes diz-nos que é com "esta utilização da normalização retórica fora do âmbito escolar ou da preparação dos pregadores que se verifica a abertura do período barroco da nossa literatura."
Quando se inicia o século seguinte, continuam a ser os Jesuítas que estudam, publicam e ensinam poética e a arte de bem falar, com base nos princípios aristotélicos, mas, começam a surgir trabalhos literários fora do âmbito escolar e escolástico. Críticas à poesia de Camões, estudos sobre os textos literários, e a própria tradução da Poética de Aristóteles, assim como uma imensa produção literário-retórica. Discutia-se o emprego de palavras arcaicas ou de neologismos, da antonomásia, da paronomásia, da ironia, da metáfora, da hipérbole ou da antítese. Crescem as noções da clareza, da prática e disposição das palavras, da escrita como arte que, mesmo que seja "imitação" da natureza, se cultiva e aprende, porque a arte que não acrescenta nada à realidade não é arte.
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(p.1) (Continua)

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Boas Festas!

Para todos os meus seguidores em Portugal, no Brasil, na Alemanha, nos Estados Unidos, na Polónia, na Rússia, na Inglaterra, na França, na Roménia, em África, na Índia, na Coreia, na China, e em todos os países, para não me esquecer de nenhum, envio os meus Votos de Boas Festas e de um ANO NOVO de 2013 Repleto de FELICIDADES. Que os vossos sonhos se realizem com muita saúde e alegria para poderem continuar a ler os meus modestos trabalhos, as minhas pobres palavras, repletas de desabafos e de AMOR FRATERNAL por todo o Mundo. Um abraço Universal!  

sábado, 15 de dezembro de 2012

Trabalhos de Crítica textual - Bibliografia

BIBLIOGRAFIA

ARAGON, «D'un Grand Art Nouveau: La Recherche», In: Essais de Critique Génétique, Flammarion, Paris, s/d.

BLECUA, Alberto, Manual de Crítica Textual, Madrid, Castalia, 1983.

CASTRO, Ivo, «Filologia», In: Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa.

GRÉSILLON, Almuth, Éléments de Critique Génétique. Lire les Manuscrits Modernes, Paris, P.U.F., s/d.

MAN, Paul, de, A Resistência à Teoria, Edições 70, Lisboa, 1989.

MAC GRANN, Jerome, J., A Critique of Modern Textual Criticism, Charlottesville e London, 1983, University Press of Virginia, 2ª ed., 1992.

PESSANHA, Camilo, Clepsydra, Relógio D'Água Editores, Lisboa, 1995.

PESSANHA, Camilo, Clepsydra, Assírio & Alvim, Editores, Lisboa, 2003.

PESSANHA, Camilo, Clepsidra e Outros Poemas, Círculo de Leitores,  Lisboa, 1987.

POE, Edgar Allen, Três Poemas e uma Génese, & etc., Lisboa, 1985.

PRIEGO, Miguel Ángel Pérez, La Edición de Textos, Síntesis, Madrid, 1987.

TAVANI, Giuseppe, «Edição genética e edição crítica-genética: duas metodologias ou duas filosofias?» In Revista da Biblioteca Nacional, Leituras, nº 5, Outono de 1999, pp. 143/149.

TAVANI, Giuseppe, «Edição Crítica», In: Dicionário da Literatura Medieval Galega e Portuguesa, Caminho, Lisboa, 1993.
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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

(Continuação da Conclusão)

Poderá concluir-se, então, que todas as edições, mesmo as edições críticas, são passíveis de reparos. Acreditamos bem que sim, visto que a edição de 1920 que, se pretende canónica, não é de autor, nem foi por si corrigida, nem efectuada a montagem. Mesmo assim ainda teremos as "gralhas" de impressão, os erros de edição para edição, os textos que vão surgindo em novas investigações e com novas questões, etc.
A palavra "montagem" do livro, "montagem" do jornal, que referimos na introdução, e que tanta crítica tem movido acerca da Clepsydra ser ou não ser um livro uno, veio trazer-nos à memória a época do apogeu do formalismo russo. Por volta dos anos vinte do século passado, quando a avant-garde artística juntava poetas e romancistas que eram também, ao mesmo tempo, críticos dos mais notáveis, e teóricos da literatura, como Tynianov; Eisenstein, adoptou a palavra "montagem", no sentido de conjunto, que se torna a base da obra, neste caso cinematográfica. Mas que poderemos extrapolar para uma antologia poética. E porquê? Porque, como obra de arte, um livro de poesia, é "uma estrutura de pathos", que provoca no leitor efeitos emocionais.
Cremos que António Barahona defende a antologia de 1920 nesta perspectiva. Nela existe um "pathos" que será o "cântico" uno, do poeta que foi "crucificado". A sua própria vida. Contudo, aqueles críticos que tentaram aumentar o espólio do poeta com a recolha de «manuscritos flutuantes, ou outros achados precários», «viveiros de versões,» sabem que a montagem é um princípio dialéctico, é conflito. Talvez, por isso, eventualmente, poderão estar certos, uma vez que a antologia foi montada por Ana de Castro Osório e não, pessoalmente, por Camilo Pessanha, que se limitou a agradecer e a concordar.
Por fim, depois de Franchetti elogiar a "sensível interpretação" de Esther de Lemos, de Barahona dizer que a edição de Barbara Spaggiari é honesta e elucidativa quanto à filologia, mas que o "voo" da edição, deve ser de um poeta que interpreta outro poeta, perguntámo-nos: Qual será hoje a tarefa da crítica textual? A resposta talvez não seja fácil porque, apesar de qualquer crítica depender de se saber o que quer dizer um texto, não sabemos até que ponto poderemos ser categóricos ao afirmar o que é que nos quer dizer a Clepsydra de Pessanha. Qual é a sua "chave"!? É improvável. Talvez o Poeta Herberto Hélder nos responda a esta questão quando escreve:
«E leia-se como quiser, pois ficará sempre errado»
In: A Poesia é feita contra todos

Lisboa, 15 de Outubro de 2004
(pp.13)

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição de Assírio & Alvim e A. Barahona

(Continuação da Conclusão)

Barahona pressupõe que só ao poeta, que ama outro poeta, enquanto artífice da palavra, é dado conhecer o "mistério" da poesia. Para um poeta que ama outro poeta, a sua voz torna-se "inesquecível". Assume-se como poeta que ama Pessanha, por isso, para si, a sua voz é inesquecível, tal como o terá sido para Ana de Castro Osório. Logo, a primeira Clepsydra, será a "voz inesquecível" dos que amam, amaram, Pessanha.
Digamos, em abono da verdade, que consideramos hiperbólicas as palavras "irrefutáveis; nunca (jamais); só o poeta entende de poesia." Pensamos que nada é irrefutável e que tudo se pode contradizer. Quanto a dizer que o poeta "nunca (jamais)" escreve sozinho, na esteira da eterna tradição grega que coloca o Poeta como um mensageiro, um oráculo divino, também pode ser contestável. O autor ao assumir a poesia como uma "tarefa" de profissional, está naturalmente a aceitar que todo o "sacerdócio" se aprende ou que qualquer tarefa pode ser aperfeiçoada. A afirmação de que "só o poeta entende de poesia, não como professor..." está, à partida, a negar a possibilidade de Franchetti, como professor, ou Gustavo Rubim, de entender "o mistério" da poesia de Pessanha. Critica a própria edição crítica e a crítica em geral, sempre que esta não utiliza a 1ª edição como única fonte fidedigna. Verificamos isso mesmo quando Barahona diz: Ao contrário do que afirma Paulo Franchetti na introdução à sua Clepsydra, que não a de Camilo Pessanha...
Quanto à edição de que se serviu Esther de Lemos ser a de 1920, ao estudarmos a edição crítica de P. Franchetti encontramos, de facto, aquilo a que Barahona se refere, mas este editor crítico faz um elogio rasgado a "Esther de Lemos que escreveu a mais demorada e sensível interpretação da poesia de Pessanha" admitindo logo no início "do seu trabalho pioneiro" que «A Clepsydra não constitui um todo organizado; é sob aquele título, uma colectânea de poemas de Camilo Pessanha...» (pp.42) Franchetti trabalhou com a 2ª edição da Editorial Verbo, 1981, A «Clepsydra»  de  Camilo Pessanha, de Esther de Lemos, e em nota 9, Barahona  refere a 1ª edição.
Não podemos verificar se de facto existe esse erro nas datas, por parte de Franchetti, mas aquilo com que refuta a "distracção" de P. F. talvez não seja de todo aceitável. Presume-se deste reparo, que a leitura de P.F. não terá sido atenta, mas também se pode presumir que não vem, de forma explícita, na obra da estudiosa, o livro que lhe serviu de texto-base.
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(Continua) Exc.12

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

CONCLUSÃO

"O conteúdo da poesia reside na probabilidade do improvável"
Paul Vallery

Ao concluirmos esta breve descrição e resenha, não poderemos deixar de dizer que a edição conjunta de Assírio & Alvim e António Barahona, constituiu para nós uma surpresa, pela afirmação desassombrada e quase categórica da maior parte do seu posfácio. No entanto, também temos de dizer que concordamos com muitas das suas escolhas, opiniões e palavras que subscreveríamos sem hesitação.
A escolha de colocar primeiro todos os poemas que constituem esta Clepsydra, dita de Pessanha, agradou-nos porque sempre fomos avessos a ler grandes preâmbulos. O amor pela poesia leva o leitor directamente aos versos, como o sequioso à água que o consola. Começámos logo por observar, que as opções de fixação de texto eram muito distintas das de P. Franchetti.
Barahona adopta, na quadra da página 9, "Eu vi a luz num país perdido.", a ortografia e a acentuação actual, ao contrário da edição crítica de P. Franchetti que mantém a original (paiz; languida; podesse; deslisar). No entanto, a dado passo das suas notas, Barahona diz que Pessanha não aderiu ao acordo ortográfico de 1911 e que quis manter a grafia antiga na edição de 1920.
No primeiro soneto do livro, na página 12, (que Franchetti coloca na página 131, como o 49º poema), o 1º verso onde surge a palavra "complicadas", aparece em P.F. "opolentas" e a pontuação, que em Barahona termina com dois pontos, é em P.F. um ponto de exclamação. Assim temos não um só verso, mas dois versos: «Tatuagens complicadas do meu peito: » e "Tatuagens opulentas do meu peito!" Neste só soneto, são várias as diferenças de pontuação, do uso de grafia, de palavras, etc.
A pesquisa das diferenças encontradas entre os dois textos, levou-nos por caminhos nunca antes experimentados. O 2º soneto, ESTÁTUA, na edição de Barahona, é em Paulo Franchetti o 10º poema, na página 85; num apresenta-se a ortografia actualizada, noutro, a antiga, segundo preconizou Pessanha. Esta análise levar-nos-ia a um trabalho com a dimensão do livro em resenha e não caberia neste contexto. Contudo não poderemos deixar de revelar a surpresa que sentimos quando lemos que, "só um poeta pode reeditar a Clepsydra."
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(continua) excerto 11

domingo, 9 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

III

Esta terceira parte sublinha que Camilo Pessanha é o maior Poeta Simbolista Português, apesar de, como estudante em Coimbra, se ter divorciado do movimento académico em que "pontificava Eugénio de Castro."
"A obra de arte, ou poema, é de uma solidão infinita, lá diz Rainer Maria Rilke." Pessanha viveu-a na solidão, sem aderir a escolas e, como único, construiu "as suas coordenadas culturais..." (pp.170)
A crítica acerada contra Gustavo Rubim volta a pontuar este texto e Barahona conclui que o seu trabalho naufraga mesmo junto à margem; cito:
"O navio de Gustavo Rubim, apesar da prudência e da bússola analítica, sem nunca perder de vista terra firme, acaba por naufragar nos recifes de Barthes, Derrida, Deleuze, Kristeva... a que se agarraram algumas lapas portuguesas, e no banco de areia de um mero historiador da literatura, Óscar Lopes, classificado por Rubim como «um dos mais importantes críticos literários portugueses» mas do qual apenas, e ambiguamente alguma mnemónica se resgata." (pp.172)
Nesta sua crítica, o autor advoga que "entre António Quadros e Óscar Lopes venha o diabo e escolha," pois ambos servem os seus opostos catecismos, uma vez que a poesia é instrumento do poeta e só através da sua presença funciona. Ou seja: "O poeta protagoniza sempre os seus poemas, porque lhes é interior: o eu que figura nos poemas consiste, portanto, numa realidade espiritual. O poeta só é exterior aos seus poemas depois de os escrever, e reescrever, quantas vezes forem necessárias, até alcançar a perfeita com-fusão e co-incidência consigo próprio, lírico, centro do mundo, homem universal."
Aqui fica a tese de António Barahona: só os poetas são os mais habilitados estudantes de poesia, eles não a definem, porque sabem "por experiência própria, na sua ignorância, em que consiste a poesia: espelho caleidoscópio das suas vidas e morte quotidianas, amores, memórias, leituras, viagens, privações etc., etc., que se estilhaça e dilui no seu próprio reflexo, transmutado em objecto infinito e reflexão." (pp.171)
Para este autor "há poetas que, por serem muito grandes, não cabem na história da literatura." (pp.173)
Mas mesmo que os calquem a pés juntos, fica sempre alguma coisa que canta com voz irredutível e soberana... a víscera do coração.
"Na Clepsydra de Pessanha, tal como na obra de Camões, perpassa a imaginação criadora da alma portuguesa..." (pp.170)
Termina o autor com Ruy Cinatti, o poeta que lhe abriu esta crítica da crítica, esta fixação de texto de Camilo Pessanha.

«A poesia é a autobiografia do poeta ou do nómada em escala de partida: o seu cântico»

O posfácio data de : Lisboa, 10 de Junho de 2002

Em P.S. novos agradecimentos. Desta feita a Luís Abel Ferreira, sem o qual esta tarefa não seria levada a bom termo.

Na página 175 iniciam-se as Notas que se prolongam até à 183ª página. Verso da página em branco e, na seguinte, 185, estão as Notas à fixação do texto da Clepsydra, que se prolongam até à 198.
Da página 199 à 205, seguem-se as Notas à fixação do texto de "Outros Poemas". Depois do verso da página em branco, temos a Cronologia, que se desenrola da página 207 à página 214. Na seguinte, 215, a Bibliografia. Na página 221, uma Tábua que serve de índice do livro.
Por fim, na página 222 e 223, o ÍNDICE DE TÍTULOS E PRIMEIROS VERSOS. Na última página, ao fundo e ao centro, o nome dos editores, a morada, e o nome de António Barahona (2003). O nº de edição, a data, Abril de 2003, e os respectivos registos, ISBN e Depósito Legal. A tiragem foi de 3000 exemplares. Como última informação o nome e a morada onde foi impresso o livro.
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(Continua) p.10

sábado, 8 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

II

Esta segunda parte do posfácio inicia-se, na página 150,  com a transcrição de um excerto da carta de Pessanha a seu pai, datada de 1894. Em seguida, Barahona tece considerações sobre a religiosidade do Poeta. São várias as interrogações que se fazem e as respostas que se dão ao leitor, umas, baseadas no estudos de João Gaspar Simões,  outras, de Barahona, que defende o seu ponto de vista sobre esta questão. Recorre a Pascal, nos seus Fragments Polémiques, para melhor explicar a heresia, e, por fim, conclui que Pessanha "não era ateu e muito menos herético porque não excluía nenhuma verdade da verdade total..." Antes de continuar a sua exposição sobre o paradoxo de se negar a religião como cultura, cita João Gaspar Simões que escreveu na sua biografia de Pessanha: «A doença fazia dele um Cristo descido da cruz.»
Falta fazer-se o estudo teológico da Clepsydra e da personalidade do Poeta, na qualidade de Mestre espiritual." Afirma Barahona. Esse "mestre" que a António Osório de Castro pareceu um santo, e que Carlos Amaro conheceu com um "ar de Príncipe e de vagabundo, na sua imensa humildade e no seu infinito orgulho..." com uma "face que, em certos instantes, era iluminada a relâmpagos de deslumbrante e sobrenatural beleza!" Barahona conclui, depois de muitas citações,  que "também Camilo Pessanha, foi crucificado."
A biografia do Poeta vai-se desenrolando, ao longo desta segunda parte, com diversos argumentos e citações que servem para Barahona levantar a sua tese e concluir com o seguinte epílogo: Camilo Pessanha foi, é e será, a par de Mestre de Poesia, Mestre Espiritual; e, a par de Rimbaud, Mestre de Silêncio." Ele fazia parte daquela linguagem própria dos Poetas, "generosa" e pertencia também à "heróica" nobreza, pois, nas suas veias, circulava "o sangue da ilustre família genovesa, fundada em 1317 pelo Almirante de D. Dinis, Mister Manuel Pessagno ou Pezagno, à qual se orgulhava de pertencer, segundo o autor.
Resta ainda referir, a terminar esta segunda parte, o aspecto de Camilo Pessanha ter pertencido ao Grande Oriente Lusitano, e de ter tido o grau de Cavaleiro Rosa-Cruz. Barahona discorre sobre a Maçonaria, novamente com o apoio de muitas citações, e considera que, a este facto, não deve deixar de ter sido alheia "a influência da sua Irmã de Poesia, Ana de Castro Osório."  Induz, por fim, que maçon  por estratégia de estudo,  usou a Maçonaria como depósito de segredos da simbólica e da estrutura das catedrais,  a que não são alheias a estrutura e a simbólica da Clepsydra." (pp.165)
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(continua)  p.9

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição de Assírio & Alvim e A. Barahona

Barahona diz aos leitores que, "desde o Orpheu, por anúncio de Fernando Pessoa e Mário de Sá Carneiro que Camilo Pessanha é Mestre de poetas e, portanto, só um poeta pode reeditar a Clepsydra." (Em notas 27 e 28, explana as opiniões, dos dois Poetas citados, sobre a obra de Pessanha. Entre os maiores elogios, Mário de Sá Carneiro chama ao Poeta, ainda por editar, «o grande ritmista.» e diz que «os seus poemas engastam mágicas pedrarias que transmudam cores e músicas... em ritmos de sortilégio - cadências misteriosas...»)
A celebração de Pessanha pelos Poetas seus contemporâneos terá sido unânime, e, num amor incondicional, António Barahona afirma que o pequeno livro das Edições Lusitânia se tornou um «missal» destes Poetas e das gerações vindouras, "enquanto se falar, escrever e amar a língua portuguesa."
Seguidamente o autor diz-nos que a sua fixação de texto começa onde parou a investigação filológica" de Barbara Spaggiari, que considera honesta e "levada a bom termo". Nesta edição crítica, a autora inventaria e estuda minuciosamente, "todas as variantes genéticas e evolutivas dos Poemas de Camilo Pessanha." Esta edição será, por isso, "mais um alicerce, além dos três inicialmente consignados," do seu trabalho que considera edificante.
Por último, refere um outro alicerce que lhe serve também de "alerta e ponto de partida: um artigo de Mário Cesariny, publicado no extinto Jornal de Letras e Artes, em Novembro de 1967, e posteriormente coligido em livro."
Segue-se a narração intercalada de:"as mãos na água/ a cabeça no mar," 1972, pp.97 - 100, de Mário Cesariny, onde se confirma que a "verdadeira obra" de Pessanha são as trinta poesias da edição original e se condena "as descobertas para pior" feitas "a posteriori". Só a edição de Barbara Spaggiari é vista por Barahona, como a mais elucidativa, autorizada e completa, mas tendo como fronteira, a filologia, o que lhe permite que o seu trabalho fique "à beira do abismo" e sirva de trampolim, suporte e "sustentação de voo" para o salto a dar pelo Poeta que irá, esse sim, editar Pessanha.
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(Continua) p.8   

domingo, 2 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

Em seguida, Barahona diz-nos o que entende por "reedição poética". O editor deve dar à estampa a 1ª edição da Clepsydra, "exactamente com a mesma ordem; ortografia actualizada só nos casos em que a prosódia não se altera e haja uma perfeita correspondência e fonia, salvante algumas palavras nas quais se conserva a ortografia etimológica como fisionomia do objecto nomeado, por analogia com a escrita ideogramática chinesa, tão cara a Pessanha." Numa extensiva nota, a 19, o autor da fixação do texto, transcreve palavras de Barbara Spaggiari, em que se justifica o gosto de Pessanha pela escrita ideográfica e que explicariam a escolha "da singular roupagem gráfica" dada à 1ª edição, que não aderiu à reforma ortográfica de 1911 e preferiu manter a grafia antiga. Segue-se uma referência a Teixeira de Pascoais que também não aderiu à reforma de 1911 porque, tal como deixou escrito, «a forma gráfica das Palavras deve estar em harmonia com o seu sentido íntimo ou parte subjectiva e com as leis da estética.» (pp.176)
Quanto à pontuação deve ser "idêntica aos intervalos do silêncio que tornam a música audível." Pessanha, afirma Barahona, seguiu a poética do seu mestre Verlaine, e pontuou os seus versos numa cadência musical, como se de solfejo se tratasse, "numa espécie de notação," que levava a certas "liberdades poéticas." Deixou de lado a vírgula, ou ponto de exclamação a seguir às interjeições e a "virgula a seguir ao ponto de exclamação, no meio da frase."
Por fim, a reedição poética, segundo Barahona, deve emendar as "gralhas da 1ª edição, devolvendo ao texto a sua pureza: texto saído, pela segunda vez, das mãos do Poeta que vive em nós."
Ainda acerca da pontuação, o autor tece outras considerações que mostram as várias influências que Pessanha terá tido para além de Verlaine, como, por exemplo, a tradução das Elegias Chinesas, e realça a importância da pontuação que "desempenha duas funções principais: marca os tempos (sem os quais não existe melodia) e, simultaneamente, enforma as charneiras, ou os liames, na coordenação gramatical, na maioria dos casos assindéctica, ou na subordinação desarticulada e sem sintaxe lógica." (pp.144)
Na opinião do autor, quando se lê Pessanha, é-nos possível, através da sua linguagem, fazer "ideogramas imaginários" e ver as "coisas em movimento" Tal como se verifica "com as caligrafias inventadas por Henri Michaux." (Emergences-Résurgenses, 1972) Há como que uma libertação da "episteme dominada pela sintaxe da gramática grega." Camilo Pessanha seria uma mescla de Ocidental, que nunca deixou de ser, e de Oriental. Ao silogismo que se funda "na lógica da identidade e que dá forma à questão de inferência," assimilou o pensamento analógico chinês, "na matemática inspirada da sua poesia." A experiência das Elegias Chinesas e o seu "exílio" silencioso e voluntário, em Macau, "por desgosto de amor", terão contribuído para a "construção" da sua obra.   
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(continua) p.7

sábado, 1 de dezembro de 2012

Clepydra de C. Pessanha - Edição de Assírio & Alvim e António Barahona

(Continuação)

A este factor alia a pressuposta discordância com a vontade de Pessanha que estaria expressa na 1ª edição. Barahona considera que há uma factura a pagar pelas diversas edições que se vão fazendo ao livre arbítrio de cada crítico, ou professor, onde cada um adopta o seu método na selecção e fixação de poemas do poeta. Digamos que essa factura é consequência do "capricho" de cada um que se dedica a investigar Pessanha e que cria um "novo" Pessanha, em cada nova edição. O autêntico, esse, só estará presente na edição de 1920, porque foi aquela com que o poeta concordou.
Mesmo que os poemas sejam mudos, como os classificou Edmundo Bettencourt, "os poetas são todos ouvidos, na sua demanda do silêncio:"  escreve Barahona. Comparam-se, pelo seu ouvido apurado "a um muálimo (professor) numa madrassa," que ouve a totalidade dos seus alunos como "uma orquestra vocal, numa sonora visão de conjunto." Assim se constitui a Clepsydra, num só Poema, mesmo que repetido em simultâneo por trinta leitores que recomecem em voz alta a ler cada poema.
Depois de ter apresentado  razões da sua crítica ao trabalho de P. Franchetti ("fruto de quem não vê quase nada"), inicia a crítica à última edição, ou ensaio de edição, de Gustavo Rubim. Mesmo que Barahona veja, na sua edição, a virtude de intuir "a unidade da Clepsydra (falseada ou perdida) como Ou o poema contínuo" e uma tentativa de recompor o livro, considera que se enganou. E porquê? Porque o livro já estava composto. "Só não se engana, quando sentencia: «O livro não se confunde com a totalidade dos textos que alguém escreveu; num certo sentido, o livro de poesia nasce necessariamente como antologia. Faz-se por subtracção e desfaz-se quando se converte em mera acumulação.»"
"Gustavo Rubim não se terá dado conta de que a antologia de que fala, o livro apurado por subtracção, já estava publicado por Ana de Castro Osório, em 1920, com a aprovação expressa de Camilo Pessanha; e que as suas supracitadas considerações  poder-se-iam aplicar à letra, à Clepsydra inicial, e não à sua, que, no seguimento das de João de Castro Osório e Paulo Franchetti, desvirtua a vontade do Poeta e os seus versos." (pp.142/143)
Transcrevemos esta crítica demolidora para realçar o facto de que Barahona considera como arquétipo ou "edição canónica", a de 1920. Tudo o resto são "viveiros de versões" que se nega a analisar porque, se tornaria fastidioso, ("à imagem dos próprios textos").
Mesmo que pareça um paradoxo, continua a haver um cânone; a única coisa a fazer é reeditar sucessivamente a 1ª edição poética.
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(Continua) p.6

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha- Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

Vejamos, diz o autor, que "bastaria reparar na esdrúxula da título (da qual, aliás, a estudiosa não é responsável) e continuar a ler a presente nota e os trechos citados ao longo do ensaio para se perceber, com certeza, que Esther de Lemos se referia à edição de 1945." (pp.140)
A diferença, para Barahona, reside entre uma antologia que constitui um todo, e uma colectânea, entre a 1ª edição de 1920 e as posteriores, "falseadas." Aponta a conclusão de António Falcão Rodrigues de Oliveira como não menos pertinente, apesar de contrária à de P.F., e refere que este autor, ao escrever o ensaio O simbolismo de Camilo Pessanha, tendo por base "a edição de 1969, muito pior do que a de 1945," afirma que a obra de Pessanha constitui um todo, "uma profunda unidade, embora esteja arrumada em duas partes: Sonetos e Poesias". O elemento principal do livro: a água, donde se extrai o título, segundo o mesmo autor, daria ao texto uma "unidade fluida e fluente."
Barahona interroga-se como podem duas opiniões opostas gozar de pertinência. Quanto a Esther de Lemos, diz-nos que foi influenciada por João de Castro Osório de viva voz e por escrito. O seu trabalho de pesquisa não se teria encaminhado no sentido de encontrar a unidade do texto, uma vez que trabalhou e conviveu com a "primeira edição adulterada." E conclui que o próprio João de Castro Osório na edição de 1969 (pp.119), defende a Clepsydra como «Poema uno, com início e final de intensa e profunda explicação psicológica.»
O posfácio avança com a defesa de que a Clepsydra autêntica é a de 1920 e que o seu estudo exige a leitura e a retenção dos 30 poemas que a compõem. Só depois de decorados e muito repetidos é que se começa a vislumbrar a "sua extrema e rigorosa unidade, obtida por despojamento, sem uma falha: afinal um uno e único Poema em quadra (Inscrição), 15 sonetos e 14 Poesias. Neste Poema, os quatro primeiros versos introduzem todos os restantes e o título é retomado nos últimos versos para fecho e epílogo." Este poema uno, para Barahona, estabelece estreitas relações entre a poesia, a música e  a arquitectura.
Segue-se a condenação da recolha de "manuscritos flutuantes ou outros achados precários, fragmentários e extrapolados do contexto" que só demonstram "a falta de sensibilidade auditiva, aliada a total ignorância da génese poética, sua elaboração e percurso até à versão definitiva, à qual não se pode mudar uma vírgula sem que a harmonia se altere e se desmorone com fragor." (pp.141)
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(continua) p.5

sábado, 24 de novembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

I

Barahona coloca a sua tese alicerçada em "três argumentos irrefutáveis:" «1º - o poeta nunca (jamais) escreve sozinho: anjo, mulher, ou demónio está sempre a seu lado e pega-lhe na mão enquanto escreve; 2º -  o poeta tem a sua poética; e 3º - só o poeta entende de poesia, não como professor, mas como professo e profissional.»
Em nota, chama a atenção para o sentido da palavra "profissional" que aqui aplica no sentido que Pascal lhe atribuiu: «alguém que cumpre uma tarefa por vocação e sacerdócio.»
Prosseguindo, defende que não há a menor dúvida de que Pessanha aceitou como sua, a 1ª edição de Clepsydra, tornando-se assim na "lição autorizada", e com o mesmo estatuto de um texto publicado em vida do escritor. Para a confirmação desse facto transcreve o 3º e 5º parágrafo da carta de Pessanha a Ana de Castro Osório, datada de 3 de Junho de 1921, e passa a rejeitar todas as probabilidades e conjecturas que Franchetti coloca acerca da mesma.
Apela à clarividência que se entronca na sensibilidade poética, vivida através da biografia, "havida ou a haver," do entendimento poético entre ambos, e recorda a ternura do post scriptum da mesma carta: «Seria uma iniquidade pedir-lhe que me escrevesse; mas, quando houver jornais... não se esqueça de me mandar um ou outro... e que eu reconheça no endereço a sua letra. É também para mim uma doce evocação familiar.» Para Barahona é evidente que «A carta não é protocolar, nem manifesta nenhum desagrado no respeitante à edição da Clepsydra: é a carta de um apaixonado, tímido e não correspondido, à sua cúmplice e musa, aquela que, com ele, escrevia e, simultaneamente, o inspirava. (...) Camilo Pessanha amava Ana de Castro Osório.»
A chave da Clepsydra está, segundo Barahona, nesse amor. Mesmo que não tenha sido um amor correspondido no plano sentimental, Ana Osório tornou-se numa amiga amorosa, sendo a prova mais evidente desse amor espiritual, a publicação do livro de Pessanha. Esse amor também terá sido pelo seu filho, João de Castro Osório, mas este ao querer passar a Clepsydra de uma antologia para uma colectânea, traiu esse amor espiritual entre poetas. Barahona vê na sua diligência e na sua busca de inéditos e variantes uma penitência que não o redime do desastre das posteriores edições.
Lamenta o facto de Franchetti afirmar que Ester de Lemos trabalhou com a edição de 1920, quando o texto estudado por esta autora foi o de 1945. Barahona diz que P. Franchetti quis "fundamentar o equívoco de que não há unidade na Clepsydra, mas tão-só uma recolha de poemas arrumados segundo «critérios puramente formais» alheios ao projecto do autor." (pp.140)
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(Continua) p.4

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

Na 1ª página desta edição surge, ao fundo e ao centro, escrito em latim:

Documenta poetica

(Pressupõe-se que é o nome de uma colecção de poesia da editora, porém não há qualquer informação ao leitor que compre pela 1ª vez o livro.)

No verso da página, observamos uma fotografia, tipo passe, de Camilo Pessanha datada de 1916.

Na 3ª página surge o título do livro, o nome do autor e a cargo de quem esteve a fixação do texto e a escrita do posfácio, seguido do nome dos editores:

CLEPSYDRA

POEMAS DE
CAMILO  PESSANHA

Posfácio e fixação do texto
António Barahona

ASSÍRIO & ALVIM 

No verso da página, a folha de rosto das Edições Lusitânia de Clepsydra, Poemas de Camilo Pessanha.

A 5ª página é preenchida simplesmente com o nome do livro, ao centro: CLEPSYDRA. Verso da página em branco

Na 7ª página, acima do centro da página, e do lado direito, o título do poema, INSCRIÇÃO. Verso da página em branco. Segue-se, na 9ª página, a quadra «Eu vi a luz em um país perdido.»

A 10ª página está em branco e a 11ª tem escrito, acima do centro da página, e do lado direito SONETOS.

Da 12ª  página à 41ª, seguem-se os Sonetos. Depois de uma página em branco, temos na seguinte, acima do centro da página, e do lado direito, escrito: POESIAS.

Da 44ª página até à 69ª temos as Poesias. A uma página em branco segue-se outra, com a palavra: FINAL, escrita acima do centro da página, e do lado direito. A partir das 72ª e 73ª páginas, temos este único poema: «Ó cores virtuais que jazeis subterrâneas,»...

A 74ª página ficou em branco e segue-se um novo título: OUTROS POEMAS. O verso da página está em branco e, na página seguinte, está escrito: SONETOS. Da 78ª página até à 99ª temos os sonetos.

Novo verso de página em branco e na seguinte, acima do centro da página, e do lado direito, escrito: POESIAS. Da 102ª página até à 132ª temos as poesias.

Inicia-se o POSFÁCIO, título da página 133, escrito acima do centro da página, e do lado direito. Verso da página em branco.

Na página 135, observamos uma fotografia de António Osório de Castro e Camilo Pessanha, em Março de 1916. Estão ambos sentados, António apoiado a uma pequena mesa, onde estão papéis soltos, seguros com uma das suas mãos. Outra mão apoia o queixo e levanta-lhe levemente o rosto, levando-lhe o olhar terno, de adolescente, numa direcção abstracta. O Poeta olha em sentido contrário, circunspecto, melancólico, porte altivo, com as mãos pousadas em cima dos joelhos traçados, o cigarro entre os dedos da mão direita que assenta, em cruz, na esquerda. 
Poderemos dizer que esta foto remata o livro «Clepsydra», ou inicia a tese que Barahona defende no Posfácio. Ela espelha a amizade serena entre os poetas, a junção da Primavera esperançosa de António e o triste Outono de Pessanha.

No verso da página, acima do centro e do lado esquerdo, estão agradecimentos a Herberto Helder; Luís Abel Ferreira; Luís Manuel Gaspar e Manuel Vieira da Cruz.

Segue-se, da 137ª página à 174ª, "A Chave da Clepsydra", tese que Barahona começa de imediato a defender com a inclusão de dois versos de Ruy Cinatti em epígrafe:
«Os que me amam, conhecem o mistério/Que torna a minha voz inesquecível.»
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(Continua) p.3

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

(Continuação da Introdução)

Sabemos que Camilo Pessanha também começou por publicar os seus poemas em revistas e jornais. E que foram, alguns desses textos, que serviram de "lição" para a recompilação, mais tardia, que se fez da sua obra dispersa. No entanto, apesar da maioria dos autores rever o texto antes da sua publicação em livro, crê-se que Pessanha não tornou aos poemas que foram publicados nos periódicos. Possivelmente nem mesmo emendou todos aqueles que ditou, que foram escritos à mão e posteriormente impressos. Os erros podem ter surgido nestas fases intermédias e nas próprias edições sucessivas da sua obra. Foram vários, desde Ana de Castro Osório, aqueles que fixaram o texto, Clepsydra. O que verificamos, depois da leitura de edições diferentes, é que há opiniões diversas acerca de variados poemas, quer no que concerne à pontuação, quer no que se refere à ortografia, ou mesmo na aplicação de outras palavras que alteram o sentido dos poemas. Por isso, é que Blecua salienta que o texto pode sofrer, através das sucessivas edições impressas, transformações tão profundas, que o convertem numa obra praticamente nova. (pp.230)
Proust escreveu que «os livros são relíquias preciosas do crente pela inteligência, do apaixonado pelo pensamento.» Poderemos nós, leitores de Pessanha, possuir neste seu livro essa relíquia, esse texto ideal que nos dá a sua inteligência, sensibilidade, ser e pensamento? J. McGann diz-nos que os "textos ideais" não existem e que os críticos usam o texto ideal heuristicamente, como um aviso focando o estudo dos documentos existentes. Porém, para o editor dos trabalhos modernos mais recentes, o primeiro e crucial problema não é como descobrir viciações, mas como distinguir, e finalmente escolher, entre versões textuais. Vamos partir para a escolha que fez António Barahona e verificar as principais diferenças entre a sua fixação de texto na edição da Assírio & Alvim, e a edição crítica de Paulo Franchetti e de outras edições que são referidas por este Poeta que faz a fixação do texto de outro Poeta: Camilo Pessanha.
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(1) ARAGON, «D'un Grand Art Nouveau: La Recherche» In: Essais de Critique Génétique, Paris, Flammarin, pp.8.
p.2

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e António Barahona

Cada um por seu lado!... Eu vou sozinho.
                                         Camilo Pessanha




Cessai de cogitar, o abysmo não sondeis.
                                         Camilo Pessanha




Ó meu coração torna para trás,
Donde vais a correr, desatinado?
Camilo Pessanha
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"Bien sûr, que je crois avoir le droit, de mon côté, a la critique de la critique...
... excusez le parfum kantien de ce que je prétends là." (1)
Aragon

INTRODUÇÃO

Alberto Blecua, no seu Manual de Crítica Textual, chama a atenção para o facto de, durante os séculos XIX e XX, a transmissão da obra literária se ter desenrolado de forma completamente distinta dos séculos anteriores. Refere que o espectacular avanço da imprensa, as suas novas técnicas, o surgimento do escritor profissional, que se torna também jornalista, o aumento do público leitor e a sua consequente diversidade, são, no seu conjunto, factores novos, que incidiram de forma determinante na criação e na transmissão da obra literária. (pp.227)
À oportunidade de publicar nos jornais periódicos aliaram-se as mais variadas dificuldades, uma vez que surgiram novas questões a resolver. Uma delas foi a do limite de tempo que o redactor tinha para a montagem do periódico, outra foi a do espaço a que teve de se cingir. Outras, ainda, tinham que ver com questões ideológicas e com a atenção aos diversos públicos que os jornais pretendiam atingir. Tudo isso originava que a criação artística fosse substancialmente afectada. Os textos deveriam limitar-se a ser breves. A correcção das provas nem sempre era a mais rigorosa e a precipitação da entrega dos originais e da sua publicação, levava a que surgissem os mais diversos erros. Daí a necessidade dessa «grande arte nova», como Aragon chamou à pesquisa, averiguação ou procura que buscava o apuro, o esmero, a verdade do que o poeta escreveu. Contudo, ele também se arroga o direito de criticar a própria crítica textual. É o que vai, igualmente, fazer António Barahona, ao fixar o texto que escolheu como o mais fidedigno para esta edição que nos propomos trabalhar. Vai apontar os "erros" que encontrou em outras edições da Clepsydra e dizer de sua justiça.
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(continua) p. 1



















As minhas poesias

As minhas poesias
Espalho-as aos Ventos
Pergunto-lhes:
-Quem sois?
-Que quereis de mim?
-Queremos a tua alma, respondem.
-Os ventos da vida a levaram.
Corro desatinada
Em busca dos Ventos
Para os alcançar.
Pergunto-lhes:
-Quem sois?
-Que quereis de mim?
-Queremos o teu coração
-Oh! Onde ele vai ...
Há tanto tempo despedaçado!
Corro em busca dos Ventos
Bóreas, Éolo e os Zéfiros
Brandos dizem-me:
-Não corras mais desatinada
Os abismos não sondeis.
A vida é morta em ti
Se o teu coração não voltar
para trás!

Ana Lima Serra


Nota aos meus leitores

A edição com que trabalhei, para fazer a sinopse da Clepsydra de Camilo Pessanha, com "estabelecimento de texto, introdução crítica, notas e comentários por Paulo Franchetti", é da Relógio D'Água Editores, do ano de 1995, Lisboa.
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Para o trabalho do segundo semestre de Crítica Textual II, continuei com a investigação sobre as edições da Clepsydra de Camilo Pessanha e escolhi a Edição da Assírio & Alvim, com posfácio e fixação do texto   de António Barahona, Lisboa, Abril de 2003.
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Vamos então ao segundo trabalho? Sim, mas não sem recordar aos meus leitores que todos estes trabalhos estão registados com direitos de autor e, por isso, se os utilizarem, devem referir o nome e o blogue donde os retiraram. Obrigada! 

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de P. Franchetti

 (Conclusão)


Verificamos que o crítico textual moderno não trabalha tipicamente na espécie de escuridão que rodeava o editor clássico. Para o editor de trabalhos mais recentes, o primeiro e crucial problema é distinguir, e finalmente escolher, entre várias versões textuais, a lição a publicar. Todo este processo envolve a translação de um fenómeno psicológico inicial ("o processo criativo"), - e era este que P.F. queria compreender, por isso se aproximou o mais possível da génese, dos documentos autógrafos de Camilo Pessanha - num fenómeno social (o trabalho literário). Aí reside a verdadeira dificuldade, principalmente quando "a ordenação dos poemas é um problema sem solução." Faltava a P.F. e aos anteriores editores, "um desenho geral e coerente" dado à obra, pelo autor.
Temos, por isso, a edição crítica de Paulo Franchetti, realizada por um leitor e um filólogo que se quis perfeito. 
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segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da Edição Crítica de Paulo Franchetti


"Quem polluiu, quem rasgou os meus lençoes de linho,
                                             Onde esperei morrer, - meus tão castos lençoes?"
Camilo Pessanha


CONCLUSÃO

Jerome J. McGann diz, num texto que nos foi dado ler, que devido a circunstâncias históricas especiais sob as quais o criticismo textual se desenvolveu, o problema crucial com que se defronta o editor de textos modernos acabou por envolver uma determinação das intenções finais. Este problema teve se ser resolvido, pois a sua solução habilita o editor que trabalha sob regras predominantes a decidir sobre um texto - base para a sua edição crítica. De acordo com a linha de raciocínio Gaskell-Thorpe, a primeira edição será normalmente escolhida como texto-base, porque permanece perto do «texto como o autor queria que fosse lido» (pp.64). Mas a posição de Bowers é a de que o manuscrito do autor é uma autoridade mais alta - está mais perto das intenções finais do autor - visto que não contém qualquer da contaminações produzidas durante a passagem do trabalho pela imprensa.
Estas posições rivais partilham a opinião de que a regra das intenções finais orientará a escolha do texto-base.
O que acontece é que este autor, J. McGann, defende que tais decisões não precisam, de modo nenhum, de depender de qualquer conceito das intenções do autor. Refere como exemplo Greg, que ao fazer uma análise racional de Shakespeare não empregou tal conceito, ou pelo menos em parte, porque compreendia muito bem as circunstâncias sociais e históricas em que os textos foram produzidos. O conceito das intenções do autor não pode ser usado como medida definitiva para determinar decisões editoriais quando se não adequa à realidade ou circunstância em que a obra foi escrita. Reconhece, no entanto, que quando os editores lidam com trabalhos posteriores, (como é a edição de P.F.), as decisões acerca do texto-base têm, progressivamente, vindo a envolver determinações acerca das intenções do autor. E porquê? Porque, devido à evidência da muita documentação que se apresenta à crítica, o conceito é usado não como determinante, mas como um guia para escolher que versão do texto se vai trabalhar.
O que acabamos de constatar é que P. Franchetti, apesar de apreciar a primeira edição (A), como a mais próxima dos documentos autógrafos, não considera ser a lição a seguir nesta sua edição. Adopta, na ordenação dos poemas, as orientações exclusivamente atribuíveis a Pessanha. O que o coloca na esteira da posição de Bower, ao prezar os manuscritos do autor como a autoridade mais alta. No entanto, também perspectivou com muita acuidade todas as circunstâncias sociais e históricas em que a obra de C. Pessanha foi produzida e as consequências nefastas que isso implicou para a sua fixação de texto. Seguiu a recensão, fez o cotejo dos testemunhos, praticou a estemática e estabeleceu o texto a partir dos vários testemunhos, ordenando as fontes e dividindo-as em seis grupos por ordem de prioridade, seguindo princípios por si determinados, antecipadamente. Completou o seu trabalho com o registo das variantes, a anotação e todo o aparato crítico.
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(Continua)  

sábado, 17 de novembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Sinopse da E.C. de P.Franchetti

CLEPSYDRA

Na impossibilidade, por limite de páginas, de uma transcrição exaustiva de todos os poemas, escolhemos dar o exemplo do que inicia e do que acaba a antologia. Perfume agri-doce, de Camilo Pessanha.

                      "Eu vi a luz em um paiz perdido.
A minha alma é lânguida e inerme.
      Oh! Quem podesse deslisar sem ruido!
           No chão sumir-se, como faz um verme..."

* Intitula-se INSCRIPÇÃO  em A, B, C, D.

                              "Um fio a desdobar, que não termina.
De grinaldas de rosas de toucar."

* Em D, este fragmento identifica-se como: IMAGEM NOCTURNA DA CIDADE, VISTA DO ALTO.

NOTAS, COMENTÁRIOS E REGISTOS DE VARIANTES

O editor P. Franchetti enumera as convenções utilizadas e todas as variantes dos textos com que trabalhou, e os comentários mais diversos aos versos e poemas editados. É o mais exaustivo possível na sua análise. (Tem início na p.144 e termina na p.223) Segue-se a:

BIBLIOGRAFIA

Que se apresenta organizada da seguinte maneira:
I. DE CAMILO PESSANHA (P.228)
1.1. Poesia:
1.1.1. Edições da Clepsidra
1.1.2. Outros
1.2. Prosa
1.3.Epistolografia
II. SOBRE CAMILO PESSANHA (pp..229 a 245)

O livro apresenta ainda um:

APÊNDICE

Índice de Publicações

Índice de Autógrafos

Que faz a Relação dos poemas publicados em periódicos durante a vida de Camilo Pessanha (pp.249 a 251); e relaciona, por ordem alfabética, Os Manuscritos Autógrafos de Pessanha, conhecidos até à data desta edição, assim como indica a sua "localização e, se houver, reprodução acessível". Dá, por fim, as Siglas utilizadas. (pp.255)

Segue-se o ÍNDICE ALFABÉTICO DE TÍTULOS E DE PRIMEIROS VERSOS, e termina com o ÍNDICE GERAL.




Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da Edição Crítica de Paulo Franchetti

Considerações Finais.

Paulo Franchetti manifesta o gosto que teria em dizer que, este trabalho, reúne todos os poemas de Camilo Pessanha, mas passados que são 70 anos da morte do poeta, "é bem provável, que tal conjunto jamais seja compilado." Enumera seguidamente os textos que se perderam e nota que foram muitos. Deixa uma interrogação: "Quem sabe o que ainda nos reservam os arquivos de Macau e os espólios por catalogar em Portugal?"
O seu esforço foi trazer o maior número de informações possíveis sobre os textos já conhecidos. Por fim, refere que um trabalho destes comporta sempre deslizes, por isso, apresenta desculpas antecipadas
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(Continua).

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de P. Franchetti

III.1.3. Manuscritos dispersos.

Começa por referir o aspecto da maior parte dos manuscritos de C.P. se terem, muito provavelmente, perdido. "O poeta distribuía-os prodigamente a amigos e conhecidos." Essa perda teve consequências para a edição da sua obra poética. Não se podem medir os estragos causados. Faz, P.F., uma cuidadosa verificação de todos os documentos e partilha com o leitor as suas descobertas, dúvidas e certezas.

III.1.4. Poemas publicados durante a vida do poeta.

Não havia tão poucos poemas de C.P., como era comum dizer-se. É a constatação que P.F. faz. São numerosos os poemas publicados em vida do autor. Em nota o editor remete o leitor para o fim do volume onde se encontra a relação dos poemas.

III.1.5. Publicações póstumas a partir de autógrafos. 

São três textos cujo paradeiro P.F. desconhece. No entanto, são aqueles testemunhos de que também se serviu J.C.O..Segue-se a descrição.

III.2. Formas de registo e anotações e variantes.

As variantes vêm quase sempre referidas, diz-nos P.F., para uma melhor e mais fácil leitura. Quer no rodapé do texto, quer nas notas e comentários do aparato genético.
As convenções em rodapé são: "marcação com asterisco se se trata de variante de título, dedicatória ou numeração de poema; as variantes de verso vêm identificadas pelo número do verso a que se referem. No rodapé do texto as variantes são transcritas e, a seguir, indicada a edição em que se encontra cada uma, de acordo com as convenções" que foram utilizadas: A, B, C, D.
O primeiro verso de cada estrofe vem de acordo como Pessanha o dispunha nos manuscritos. "recolhido em relação aos seguintes". Com excepção do poema "Desejos" que se alinha à esquerda. Também optou, P.F., por iniciar os versos com maiúsculas como a maioria dos autógrafos de C.P.
"As convenções adoptadas no aparato crítico, para registo das variantes e das correcções do autor, foram pensadas em função da especificidade dos manuscritos a descrever..." Tentou P.F. fornecer todas as anotações possíveis para "permitir ao leitor interessado a leitura e cotejo das mesmas."
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(Continua)

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de P. Franchetti

III. Critérios para o estabelecimento dos textos e registo de variantes.

A primeira intenção de P.F. é "libertar os textos de todas as intervenções não justificadas dos editores," com principal incidência nas de J.C.O. Serão reparados quanto à métrica, quanto à pontuação, e quanto aos títulos que foram acrescentados ou, suprimidos. Depois de enumerar vários versos e exemplos flagrantes de alterações, P.F. informa-nos que se esforçou por, "nos casos em que havia conflito entre um documento autógrafo ou publicado e a versão de Castro Osório." modificar, "sempre que plausível" o texto de J.C.O..

III. 1. As fontes.

São várias as classes de documentos de que P.F. se serviu para estabelecer o texto dos poemas de C. P. Consideremos as informações que nos transmite. Escolheu dividi-los em seis grupos.

1º - As edições da poesia de C.P., pela seguinte ordem: Lusitânia, e Ática;
2º - manuscritos autógrafos da B.N.L., que pertencem a J.C.O.;
3º - um caderno que contém manuscritos autógrafos e recortes de poemas publicados em jornais, com correcções, que está depositado no Arquivo Histórico de Macau;
4º - conjunto formado por manuscritos autógrafos dispersos...
5º - conjunto de poemas publicados em vida do autor, em jornais e revistas...
6º - pequeno grupo de textos póstumos, publicados a partir de autógrafos perdidos, ou com paradeiro desconhecido.
Nos pontos que se seguem, o editor crítico, descreve "os demais conjuntos de testemunhos de onde proveio o texto dos poemas de Pessanha, identificando em cada grupo os documentos que forneceram a lição," por ele seguida.

III. 1.1. Os manuscritos de 1916.

Chamada de atenção para o facto de neste seu trabalho aceitar na íntegra os manuscritos de 1916. Retrato completo e descrição de todos os versos.

III.1.2. O Caderno e Camilo Pessanha.

Encontra-se no Arquivo Histórico de Macau A descrição deste caderno é exaustiva e as considerações de P.F., também são muitas, inclusive erros de cópia, etc. (desde a pp. 52 à 63)
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(Continua)


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de P.Franchetti

Contra esta hipótese, P.F. apresenta todos os indícios da carta de Pessanha ter sido de mera cortesia. Segue-se uma entrevista de A.C.O. ao Diário de Lisboa, de 21/4/1921, em que, a editora de A, "não enfatizava qualquer participação de Pessanha na ordenação" de A. Nas páginas que se seguem P.F. apresenta todas as dúvidas que se lhe colocam e, para as suas interrogações, vai sempre encontrando respostas hipotéticas, mas fundamentadas. Uma carta a José Pessanha, de 1888, uma crítica de C.P. a um livro de poemas de António Fogaça, onde refere que lhe faltaria "um desenho geral e coerente", a opinião de Esther de Lemos, outro trabalho de António Falcão R. de Oliveira, etc.
Por fim reafirma a sua tese de que "a ordenação dos poemas é um problema sem solução," uma vez que não há nada que confirme que a organização do livro se devesse à vontade do poeta, ou "pelo menos quanto à ordenação de alguns poemas." Não considera, por isso, que a única edição em vida de Pessanha seja a lição a seguir, "mesmo havendo um documento autógrafo a sancioná-la." E a solução de apresentar a edição A e depois os «Outros poemas» também não o satisfaz.
Parece-lhe "mais correcto e adequado observar, na ordenação dos poemas, apenas as orientações indubitavelmente atribuídas a Pessanha." Quanto ao nome a adoptar, para a actual edição crítica, será Clepsydra. As peças serão colocadas "pela cronologia dos textos, segundo os seguintes princípios: 

A) quando for conhecida a data da composição da primeira versão do poema ela terá precedênca sobre as     datas da revisão...
B) textos que trazem apenas indicação do ano serão antepostos aos datados do mesmo ano, mas com a indicação do mês;
C) quando não se conhecer manuscrito, nem houver registo confiável da data da composição, os textos virão ordenados pela data mais remota em que foram mencionados ou, na falta de qualquer registo, pela data da primeira publicação.
D) quando tiverem a mesma data, os textos virão dispostos por ordem alfabética de título ou primeiro verso."

Está traçado para o leitor o método utilizado e a escolha feita pelo editor P. Franchetti. Este, frisa ainda que "os poemas virão a seguir dispostos sem outro critério que não seja a frágil cronologia possível, mantidas apenas, no nível temático as indicações sequenciais presentes nos autógrafos de 1916."
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(Continua)

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de P. Franchetti

II. 1.1. A lista dos poemas a recolher para a Clepydra. 

Na edição de 1945, J.C.O., apresentou "uma lista de poemas, dividida em sonetos e «poesias», que teria sido elaborada por Pessanha por ocasião do seu regresso definitivo a Macau". P. Franchetti enumera, cuidadosamente, os poemas e diz das probabilidades, certezas e incertezas das informações sobre a sua origem. "Teria existido realmente essa lista?"... "Seria documento autógrafo de Pessanha?" O facto é que "tal lista não se encontra entre os papéis hoje depositados na Biblioteca Nacional. Ou melhor, não se encontra na forma em que foi descrita por Castro Osório." Porque P. Franchetti  conclui que, "Camilo Pessanha deixou de facto escrita em 1916, uma relação de poemas, de que hoje resta apenas um fragmento." As suas investigações localizaram-na, em 1991, embora não estivesse registada no inventário do espólio. Descreve a  «procuração» deixada em verso, por C.P. a Ana de Castro Osório e o respectivo fragmento de que não tem a certeza ter pertencido "à famosa lista".
Muitas foram as fontes e o que mostram, é a impossibilidade de determinar se a edição de 1969, corresponde "à intenção do poeta".

II. 1.2. As indicações nos autógrafos para a Clepsydra de 1920.

Neste ponto, P. F. continua a trabalhar todos os dados, para apurar uma possível base científica em que apoie a sua edição crítica. Conclui que "não há como saber o que Pessanha teria dito a Castro Osório. Mas há sim, hoje, como saber o que ele deixou por escrito. E o que deixou é bastante para, pelo menos, nos mostrar o que não disse." Volta a explanar sobre a questão e a contradizer J.C.O. e a própria editora de A. Desrespeitaram "as únicas indicações de sequência que Pessanha deixou registadas nos autógrafos de 1916."
Com a transparência que deve nortear uma investigação, P.F. diz ao leitor que "na verdade, são poucas as informações de Castro Osório em que nos podemos fiar descansadamente. (...) Se é certo que ele contribuiu muito para divulgar a obra de Pessanha, também não o é menos que com ela tomou liberdades excessivas."
Por esse motivo, considera P.F. que poderá "sem temor de incorrer em improbidade, buscar uma nova forma de ordenação dos poemas conhecidos de Camilo Pessanha."

II.2. A ordenação dos poemas de Camilo Pessanha neste trabalho.

Uma vez que às edições de B e D não há como reconhecer autoridade na sua reordenação, e isso parece claro a P.F., este interroga-se, em seguida, até que ponto a edição A terá reflectido a vontade de C.P.. Uma nova edição deveria apresentar, em separado e na mesma ordem, o conjunto de poemas da edição A? Seria ela, fiel à vontade do poeta?
A favor desta tese "há uma carta de Pessanha, datada de três de Junho de 1921, endereçada a Ana de Castro Osório: (...) «não quero deixar de agradecer-lhe, penhoradíssimo, a publicação da esquecida Clepsydra, e os cuidados da disposição (que é como eu próprio a faria) e da ortographia. (...) Acredite que foi das mais doces commoções da minha vida e da minha surpreza, ao ver assim evocada e acarinhada deante dos meus próprios olhos a minha pobre alma - ha tantos annos morta...»"
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(Continua)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Clepesydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de P. Franchetti

I. 3. A Clepsidra de 1969.

Esta edição incluiu mais um soneto e quatro «poesias», e foi-lhe acrescentado "um conjunto de «outras poesias», que não teriam sido indicadas para compor o livro".
P. Franchetti analisa as fontes dos poemas e refere que alguns fragmentos com que J.C.O. "montou o Roteiro de Vida, foram colhidos do caderno de recortes e poemas que pertenceram a C.P. e que hoje se encontra no Arquivo Histórico de Macau."

II. Comentário das edições Osório.

Quais teriam sido as intenções de Pessanha? Publicar e organizar um livro ou uma colectânea? Esta é a questão que se coloca a P.F. após ter estabelecido "a origem provável ou certa de todos os textos que compuseram o corpo principal da edição de 1969." Desejaria "uma sequência de poemas cuja ordem" obedecesse "a um claro desígnio significativo," tal como "a primeira edição das Fleur du Mal constituía um «livro de poemas»? Não se conhece a vontade do autor. No entanto, P.F. diz ao leitor que J.C.O. é, a esse respeito, claro. A Clepsidra de 1969 é um «poema uno, com início e final de intensa e profunda explicação psicológica» (D, pp.119). Segue-se a transcrição da opinião de J.C.O., "em que reafirma a distinção entre a «Clepsidra» e os Outros Poemas." Seguidamente, P.F. propõe-se investigar a autoridade destas afirmações.

II. 1. A ordenação da Clepsydra  e os documentos que a fundamentariam.

Investigar é colocar hipóteses para as quais se pressupõe encontrar, ou não, resposta. Só verificando e confirmando as hipóteses é que se podem formular novas teorias. Por isso, P.F. vai colocando questões ao longo desta sua pesquisa. Aqui, põe para discussão a seguinte: "considerando a variada origem dos textos que foram sendo sucessivamente incorporados à Clepsydra  e as seguidas reordenações do conjunto dos poemas, que peso dar à reivindicação de Castro Osório, quando das edições de 1945 e 1969, de que a última ordenação do livro era definitiva e se conformava à concepção de Camilo Pessanha?"
Começa P.F. por ordenar os documentos que teriam, segundo J.C.O., constituído as linhas orientadoras do seu trabalho "de modo a manter o desígnio de Pessanha", e vai considerar cada um em separado.
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(Continua)

domingo, 11 de novembro de 2012

Clepsydra - Camilo Pessanha- Sinopse da E. C. de P. Franchetti

I. 2. A origem dos textos acrescentados na Clepsidra de 1945 e 1956.

Onze dos poemas, que são incluídos em B e não vinham em A, têm origem, segundo P. Franchetti, em várias fontes. Dois dos autógrafos, que J.C.O. teve em mão, não foram localizados, actualmente, por P.F., e outros 9 terão vindo de revistas ou de cópias de manuscritos, etc. a que não teve acesso. Identifica algumas das revistas em que foram publicados três dos poemas: Seara Nova, Revista de Portugal (ambos em 1940) e no periódico: O Portugal (1900), e admite outras probabilidades.
Em nota refere que J.C.O. regista em D que, quando da preparação da edição B, teria tido acesso a autógrafos que pertenciam a Carlos Amaro e que lhe teriam sido conseguidos por Luís de Montalvor.
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(Continua) 

sábado, 10 de novembro de 2012

Clepsydra - Camilo Pessanha - Sinopse de P. Franchetti

(Continuação)

I. 1. A origem dos textos que compuseram a Clepsydra de 1920.

Nesta primeira edição, por aquilo que se sabe de concreto, só possuía A.C.O. 18 poemas em manuscrito autógrafo de Camilo Pessanha. Surge a dúvida de P.F.:de onde vieram os outros? Três outros poemas terão sido retirados de um jornal de província e os outros, segundo J.C.O., terão sido ditados de memória, pelo poeta, aquando da sua estada em Lisboa, em 1916. Logo, esta edição A foi realizada, praticamente toda, com autógrafos, à excepção dos três poemas.
Em nota, P.F. dá conta dos manuscritos que estão no espólio de C. P. na Biblioteca Nacional, e de todos os poemas que nele se inscrevem. Surge apenas um poema com caligrafia diferente e emendado, cresse, por Pessanha. Todos os comentários de J.C.O. são colocados em causa, porque o mesmo se contradiz a propósito do documento que, em A, teria fixado um dos sonetos. "Sucede o mesmo a propósito de outro soneto," que teria sido copiado de um autógrafo pertencente à família.
Conclui-se que há três diferentes origens para a fixação do texto A: "autógrafo, cópia de autógrafo e ditado." Mas o que parece mais claro é que alguns poemas foram colhidos de várias fontes. P.F. relaciona, em seguida, os poemas e as suas origens prováveis.
Em nota, refere-se à vontade de J.C.O. em ver-se reconhecido como editor literário de Pessanha e P.F. chama a atenção para os textos da edição de 1969. De facto, Osório parece que se indispunha com todos os estudiosos que se aproximavam da obra de Pessanha.
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(Continua)

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Clepsydra - Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de Paulo Franchetti

(Continuação)

P. Franchetti conclui que, em rigor, o que havia, até ao momento em que inicia o seu trabalho, era a edição organizada por A.C.O. em 1920. Todas as outras são modificadas e actualizadas por J.C.O..Sendo que, a de A. Quadros e a de Spaggiari quase nada acrescentaram, em crítica textual, às edições da Ática, apesar de Quadros ter registado várias leituras de autógrafos. A sua intenção, nesta edição crítica, há muito desejada pelos estudiosos de Pessanha, é registar rigorosamente as variantes e acabar com "as eventuais intervenções textuais de João de Castro Osório." Intervenções que terão sido abusivas e que já tinham sido postas em causa, em 1956, por um estudioso da vida e obra de C. P., António Dias Miguel. Em nota, P.F. remete o leitor para críticas publicadas na revista Colóquio (nº60) de autoria de Pedro da Silveira, e a de José Bento, em O Tempo e o Modo (nº71/72) e, ainda, para o número especial da Persona, dedicado a C. Pessanha, onde se encontra um texto de Alfredo Margarido (suplemento nº 11/12).
Para melhor se percepcionar as diferentes edições e se ter uma visão diacrónica do conjunto, resolve, o editor crítico, apresentar um quadro que, em colunas paralelas, apresenta as quatro edições organizadas pelos Osórios. Em nota, explicita que agrupa a 2ª e 3ª edições, uma vez que, nestas, não houve alteração na lição dos textos nem na ordenação dos poemas.
Assim, temos o quadro das edições de 1920, que P.F. identifica como a variante (A), agrupa-se a de 1945 com a de 1956, que tomam as letras (B e C), e a de 1969 que tem a letra (D). Estas letras, das diversas edições, servirão para, ao longo da fixação do texto, se reconhecer qual foi a opção tomada, ou lição final escolhida.
Segue-se uma legenda que dá as seguintes informações: "(+) Poema incluído por JCO; (-) Poema suprimido por JCO; (T) Título atribuído por ACO/JCO; (-T) Título suprimido por ACO/JCO."
Ao olhar-se para estes quadros, verifica-se que a edição A "trazia um total de 30 peças". A edição B acrescentou 11 poemas. Em D surgem mais um soneto e cinco «poesias». Outros poemas são acrescentados, o livro divide-se em três partes, passa a chamar-se Clepsidra e outros poemas e é composto por «56 peças»".
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(Continua)

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Clepsydra - Camilo Pessanha - Sinopse da E. C. de Paulo Franchetti

I. Histórico das edições da Clepsydra

O leitor toma conhecimento de que os poemas de C. P. foram sendo publicados, ao longo da sua vida, em vários jornais de Portugal e de Macau e que só em 1920 é que se editou pela primeira vez um livro com os seus versos, por iniciativa da escritora Ana de Castro Osório. Numa longa nota de rodapé, P.F. chama a atenção para o aspecto de o filho da escritora, após o seu falecimento, ter chamado a si o mérito de convencer C.P. a publicar os seus poemas. Paulo Franchetti conclui que não é plausível, uma vez que, numa entrevista ao Diário de Lisboa, em 1921, A.C.O. confirma ter sido ela que preparou a edição da Clepsydra. E, argumenta P.F., que Camilo Pessanha esteve a última vez em Lisboa em 1916, tendo nessa altura, João de Castro Osório apenas dezasseis anos, tornando-se, por isso, ainda mais improvável.
Esta edição, publicada pelas Edições Lusitânia, em Lisboa, foi a única, em vida de Camilo Pessanha, que faleceu em 1926. Haviam-se publicado também, um conjunto de 16 poemas, no número único da revista Centauro, em 1916. Em nota, P.F. dá o nome de todos os poemas publicados nessa revista trimestral de literatura.
Quando Ana de Castro Osório faleceu, o seu filho continuou a investigar a obra e a vida de C.P. e irá fazer novas actualizações da edição de 1920. A segunda edição saiu em 1945, com o nome de Clepsidra, e incluindo mais poemas. A terceira é uma reedição e veio a público em 1956. A quarta edição data de 1969, sempre pela Ática, e é considerada por J.C.O., como definitiva. Em relação às anteriores, traz novos poemas e textos de C.P., em prosa e verso e "algumas anotações de variantes e uma grande colecção de textos e comentários" de João de Castro Osório.
Em nota, P.F. informa que os textos acrescentados de C. P., são traduções de oito poemas chineses, precedidos de um prefácio do tradutor, e um outro artigo comentando a poesia de Alberto Osório de Castro, que foram publicados, respectivamente, em O Progresso, em 1914, e no semanário A Verdade, de 31/03/1910, ambos em Macau.
Segue-se a informação de que a Ática, após a morte de J.C.O., reeditou a obra, sempre com base no "arranjo e lição" da edição de 1969, eliminando apenas uma parte dos textos do organizador.
Todas as edições de outras editoras tiveram origem nas da Ática. P.F. comenta as incorrecções de alguns poemas e erros dos editores, como a da Publicações Anagrama, do Porto. Dá o exemplo de outras bem organizadas, mas também baseadas nas de J.C.O., seguindo as suas lições e leituras. São elas a da Publicações Europa-América, organizada por António Quadros, em 1988, e a da Adriática, publicada em Bari, por Bárbara Spaggiari, em 1983. Seguem-se comentários críticos, fundamentados, à organização destas edições, e há uma chamada de atenção para o facto de, na publicação de Bari, a investigadora, supostamente, não ter tido acesso aos autógrafos de C. P. na Biblioteca Nacional de Lisboa, e ao Arquivo Histórico de Macau. Em nota explicitam-se as opções de A. Quadros referentes a vários versos e dão-se exemplos de erros de transcrição, assim como se refere o aspecto de a pontuação de Pessanha ser claríssima, e de J.C.O. ter produzido absurdos que depois foram continuados nestas edições.
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(Continua)

































terça-feira, 6 de novembro de 2012

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de Paulo Franchetti

Maintenant, voyons la coulisse, l'atelier,
le laboratoire, le mécanisme intérieur...
Baudelaire

Numa nota da Relógio D'Água Editores, o leitor é informado de que "esta edição crítica retoma, com substanciais acréscimos, a que foi publicada pela Universidade Estadual de Campinas em 1994". A edição de Lisboa é de 1995  e recebeu o apoio da Fundação Fernando Pessoa. Tem capa de Fernando Mateus sobre foto do autor, Camilo Pessanha. O estabelecimento de texto, introdução crítica, notas e comentários são de Paulo Franchetti. (Nome que irei abreviar, ao longo deste texto, pelas suas iniciais, assim como o do poeta Camilo Pessanha, de Ana de Castro Osório e de seu filho, João de Castro Osório).
O livro tem início com os agradecimentos de P.F. a dezasseis pessoas e a sete instituições, todas com o nome expresso, que deram apoio à sua pesquisa.
Seguidamente surge a Introdução. Antes de apresentar a parte expositiva da introdução P.F. começa por explicar o esquema e a organização do livro para se tornar mais acessível ao leitor. Consta de três partes:
A primeira, é a introdução, onde o editor começa por contar a história das edições da poesia de Camilo Pessanha e descreve todos os testemunhos de que serviu para estabelecer o texto dos poemas e expõe os critérios que o levaram a escolher cada lição.
A segunda é a que contém as poesias de Camilo Pessanha. Em rodapé de página e, para cada poema, P.F. colocará as variantes das edições que serviram de cânone, organizadas por Ana de Castro Osório e, a seguir, por seu filho, João de Castro Osório.
Da terceira constam as anotações e comentários informativos, assim como a listagem das variantes a que P.F. teve acesso, em autógrafos ou em outras publicações anteriores.
Por fim, o editor crítico fornece uma bibliografia que não considera exaustiva e, em apêndice, dá uma lista de autógrafos conhecidos e a relação dos poemas que se publicaram em vida do poeta.
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(Continua)

Clepsydra de Camilo Pessanha - Sinopse da E.C. de Paulo Franchetti

(Fim da Introdução)

A segunda crítica textual é a crítica genética que trabalha com o original presente, manuscritos ou textos dactilografados ou a computador, impressos revistos pelo autor, em que se sabe qual a sua última fixação do texto. Então, neste caso, não será necessário estabelecer uma genealogia entre os textos e partir-se-á para uma edição de reprodução fiel da escrita. Porém, esta edição não poderá ser interpretativa e, por vezes, o editor também se depara, não com um único original, mas com várias etapas da génese do texto. Terá que escolher a fixação do texto, partindo, talvez, do pressuposto de que o último texto escrito e revisto pelo escritor é o fidedigno. E as reescritas que o autor deixou desse mesmo texto, devem ou não ser publicadas? Não trarão elas informações preciosas sobre a evolução criativa do autor? Este não será, rigorosamente, um interesse da filologia, mas irá conduzir ao desabrochar desta crítica genética.
A esta crítica - genética - digamos que lhe interessa todo o processo laboral do escritor, todas as folhas por ele escritas, desenhadas, riscadas, emendadas, mesmo que elas tenham dado origem a um único texto final, representam os rascunhos que podem ser datados cronologicamente e que, sistematizados num aparato genético, podem dar informações complementares sobre o texto e o autor. Como que propõe uma "ciência da escrita" e é, por isso, parcelar. Privilegia não o escrito, mas a escrita. A crítica genética não fala de literatura, fala da escrita. Os genéticos, ao estudar a rasura, estão a estudar a génese, o ante - texto. Esta ciência obtém um primeiro resultado com Flaubert, que escrevia e reescrevia. A literatura começava com a rasura.
Poderemos dizer que Edgar A. Poe, com o seu texto: Filosofia da Composição, ao vê-lo traduzido por Baudelaire com o título: A Génese do Poema, ou, em português, Três poemas e uma génese, terá dado início a este interesse genético da obra, ao texto como "tecitum". Tecido que se vai tecendo em sucessivos estádios até à plena e última intenção do autor. Era uma nova concepção da arte que Poe iria alimentar e que se tornaria muito importante para a modernidade, mesmo que tenha sido Baudelaire a definir essa mesma modernidade.
Apesar de Poe ter sido um escritor popular, que quis fazer algo para ser lido por um máximo de pessoas, não recusando o papel de "estrião literário", veio a influenciar não só Baudelaire, mas também Vallery, Mallarmé e Eliot. Para ele, a inspiração é atenção, energia e entusiasmo, era possível "aprender" a originalidade. O acaso e o incompreensível eram inimigos para Poe, que recusava a elegibilidade e a excluía, passando tudo pelo crivo da inteligência.
Assim como Pirandello tinha mostrado os bastidores do teatro, era necessário mostrar o mecanismo interior da construção do texto, os bastidores da escrita do poema.
Mesmo que Poe tenha construído uma ficção, o seu texto foi capital para tudo o que chamamos moderno.
Este é o trabalho da "crítica do original presente, à qual, atendendo a que o seu objecto de estudo é constituído por autógrafos preservados depois do século XIX, isto é, por manuscritos modernos, se pode também chamar crítica textual moderna." (2)
Antes de terminar esta breve introdução diremos que esta resenha, não será minuciosa mas, tentará seguir a organização do livro através da numeração e dos títulos dados pelo autor. Iremos observar o método de trabalho que Paulo Franchetti utilizou nesta "sua", Clepsydra, de Camilo Pessanha. Editor crítico que, cremos, é também "professor de leitura lenta".
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Notas:
(1)- NIETZSCHE, F., Aurora, Colecção Substância Res, pp.11.
(2)- CASTRO, Ivo de, Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa, pp.602-610.
(3)- LANCIANI, Giulia e Tavani, Giuseppe, Dicionário da Literatura Medieval Galega e Portuguesa,Editorial Caminho, Lisboa, pp.229-233.