domingo, 2 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

Em seguida, Barahona diz-nos o que entende por "reedição poética". O editor deve dar à estampa a 1ª edição da Clepsydra, "exactamente com a mesma ordem; ortografia actualizada só nos casos em que a prosódia não se altera e haja uma perfeita correspondência e fonia, salvante algumas palavras nas quais se conserva a ortografia etimológica como fisionomia do objecto nomeado, por analogia com a escrita ideogramática chinesa, tão cara a Pessanha." Numa extensiva nota, a 19, o autor da fixação do texto, transcreve palavras de Barbara Spaggiari, em que se justifica o gosto de Pessanha pela escrita ideográfica e que explicariam a escolha "da singular roupagem gráfica" dada à 1ª edição, que não aderiu à reforma ortográfica de 1911 e preferiu manter a grafia antiga. Segue-se uma referência a Teixeira de Pascoais que também não aderiu à reforma de 1911 porque, tal como deixou escrito, «a forma gráfica das Palavras deve estar em harmonia com o seu sentido íntimo ou parte subjectiva e com as leis da estética.» (pp.176)
Quanto à pontuação deve ser "idêntica aos intervalos do silêncio que tornam a música audível." Pessanha, afirma Barahona, seguiu a poética do seu mestre Verlaine, e pontuou os seus versos numa cadência musical, como se de solfejo se tratasse, "numa espécie de notação," que levava a certas "liberdades poéticas." Deixou de lado a vírgula, ou ponto de exclamação a seguir às interjeições e a "virgula a seguir ao ponto de exclamação, no meio da frase."
Por fim, a reedição poética, segundo Barahona, deve emendar as "gralhas da 1ª edição, devolvendo ao texto a sua pureza: texto saído, pela segunda vez, das mãos do Poeta que vive em nós."
Ainda acerca da pontuação, o autor tece outras considerações que mostram as várias influências que Pessanha terá tido para além de Verlaine, como, por exemplo, a tradução das Elegias Chinesas, e realça a importância da pontuação que "desempenha duas funções principais: marca os tempos (sem os quais não existe melodia) e, simultaneamente, enforma as charneiras, ou os liames, na coordenação gramatical, na maioria dos casos assindéctica, ou na subordinação desarticulada e sem sintaxe lógica." (pp.144)
Na opinião do autor, quando se lê Pessanha, é-nos possível, através da sua linguagem, fazer "ideogramas imaginários" e ver as "coisas em movimento" Tal como se verifica "com as caligrafias inventadas por Henri Michaux." (Emergences-Résurgenses, 1972) Há como que uma libertação da "episteme dominada pela sintaxe da gramática grega." Camilo Pessanha seria uma mescla de Ocidental, que nunca deixou de ser, e de Oriental. Ao silogismo que se funda "na lógica da identidade e que dá forma à questão de inferência," assimilou o pensamento analógico chinês, "na matemática inspirada da sua poesia." A experiência das Elegias Chinesas e o seu "exílio" silencioso e voluntário, em Macau, "por desgosto de amor", terão contribuído para a "construção" da sua obra.   
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(continua) p.7

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