sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Clepsydra de C. Pessanha - Resenha da Edição Assírio & Alvim e A. Barahona

(Continuação da Conclusão)

Poderá concluir-se, então, que todas as edições, mesmo as edições críticas, são passíveis de reparos. Acreditamos bem que sim, visto que a edição de 1920 que, se pretende canónica, não é de autor, nem foi por si corrigida, nem efectuada a montagem. Mesmo assim ainda teremos as "gralhas" de impressão, os erros de edição para edição, os textos que vão surgindo em novas investigações e com novas questões, etc.
A palavra "montagem" do livro, "montagem" do jornal, que referimos na introdução, e que tanta crítica tem movido acerca da Clepsydra ser ou não ser um livro uno, veio trazer-nos à memória a época do apogeu do formalismo russo. Por volta dos anos vinte do século passado, quando a avant-garde artística juntava poetas e romancistas que eram também, ao mesmo tempo, críticos dos mais notáveis, e teóricos da literatura, como Tynianov; Eisenstein, adoptou a palavra "montagem", no sentido de conjunto, que se torna a base da obra, neste caso cinematográfica. Mas que poderemos extrapolar para uma antologia poética. E porquê? Porque, como obra de arte, um livro de poesia, é "uma estrutura de pathos", que provoca no leitor efeitos emocionais.
Cremos que António Barahona defende a antologia de 1920 nesta perspectiva. Nela existe um "pathos" que será o "cântico" uno, do poeta que foi "crucificado". A sua própria vida. Contudo, aqueles críticos que tentaram aumentar o espólio do poeta com a recolha de «manuscritos flutuantes, ou outros achados precários», «viveiros de versões,» sabem que a montagem é um princípio dialéctico, é conflito. Talvez, por isso, eventualmente, poderão estar certos, uma vez que a antologia foi montada por Ana de Castro Osório e não, pessoalmente, por Camilo Pessanha, que se limitou a agradecer e a concordar.
Por fim, depois de Franchetti elogiar a "sensível interpretação" de Esther de Lemos, de Barahona dizer que a edição de Barbara Spaggiari é honesta e elucidativa quanto à filologia, mas que o "voo" da edição, deve ser de um poeta que interpreta outro poeta, perguntámo-nos: Qual será hoje a tarefa da crítica textual? A resposta talvez não seja fácil porque, apesar de qualquer crítica depender de se saber o que quer dizer um texto, não sabemos até que ponto poderemos ser categóricos ao afirmar o que é que nos quer dizer a Clepsydra de Pessanha. Qual é a sua "chave"!? É improvável. Talvez o Poeta Herberto Hélder nos responda a esta questão quando escreve:
«E leia-se como quiser, pois ficará sempre errado»
In: A Poesia é feita contra todos

Lisboa, 15 de Outubro de 2004
(pp.13)

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