sábado, 1 de setembro de 2012

Cartas Familiares de Cavaleiro de Oliveira

Carta 10

A Monsieur M. Sobre a assistencia devida aos que estão debayxo da nossa protecção.
(...)
" Logo que for necessario empreender a defesa da vossa Patria, ou dos vossos amigos, diz Epicteto, não consulteis os Magicos, nem espereis as suas respostas para obrares o que deveis. (...) Jamais o Oraculo de Apolo deo huma resposta melhor, do que aquella que fez á pergunta dos Cumos quando o mandárão consultar, perguntando se entregarião aos Persas, Pactyas, que se tinha valido da sua protecção. Respondeu o Oraculo que o integrassem. Aristodico, que era hum homem de grande autoridade affirmando e deffendendo que o Oraculo não podia ter dado huma resposta tão injusta, mostrou que esta não podia proceder que do erro, ou da falsidade dos Deputados. Ordenárão os Cumos que fosse o mesmo Aristodico com outros Deputados consultar novamente o Oraculo. (...)
Este deo a mesma resposta. Confuso, e aflito Aristodico começou a passear á roda do templo, e descobrindo na parede delle hum ninho de passaros o desfez irado atirando-lhe com pedras. No mesmo instante sahio do templo huma voz ameaçante que lhe perguntou. Para que lanças fóra do seu ninho estes pequenos animaes que estão debayxo da minha protecção?
Respondeu Aristodico. Eu obro conforme ao vosso exemplo, pois que ordenaes que entreguemos hum homem que está debayxo da nossa. Proferio então a voz ultimamente. Impios que vós sois, oh Cumos! Pois que sabendo que he cousa indigna desamparar aos que se deytão entre os vossos braços me vindes sobre essa materia consultar. He talvez para me querer tentar que o faseis? Oh impios!
Isto he o que se me offerece para vos diser a respeito..."
Vienna de Austria, 15 de Janeyro de 1737
(Carta IV, Tomo II, pp. 33, 34, 35)
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Epicteto serve de exemplo nesta Carta para o autor manifestar a sua opinião sobre os deveres que temos para com os que estão debaixo do nosso cuidado. Narra a história de Pactyas que estava sob a protecção dos Cumos e como Aristodico não concorda em entregá-lo, apesar da opinião do Oráculo de Apolo ter sido contrária. Ao ser novamente consultado pelo próprio Aristodico e tendo dado a mesma resposta este, muito zangado, atira pedras a um ninho de pássaros que estava na parede do templo. Logo a voz troante do Oráculo se manifestou irada: "Para que lanças fora do seu ninho estes pequenos animais que estão debaixo da minha protecção?" Responde-lhe, com toda a sua autoridade, que estava a fazer o mesmo que ele, Oráculo, tinha mandado fazer. A mesma voz, num vocativo irado, chama-lhes "Ímpios", porque aquilo não era sequer pergunta que se colocasse! Queriam eles tentá-lo? Eis, para a posteridade, o que se oferecia dizer a Oliveira a respeito deste assunto de moral humanística. 

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