Carta 14
Ao Senhor F. Tasso Diaxo, a respeito do Estilo dos seus Escriptos.
(...)
"Tendo conhecido que emprendestes imitar a Gongora, porem vejo que o não conseguistes com felicidade... (...) A respeito de Gongora, haveis de crer que há hum espaço infinito entre o menos bom dos seus versos, e entre o menos máo dos vossos... (...) Se póde muito bem diser sem afrontar-vos, que vós, e elle são dous Antipodas. (...)
O vosso estilo he justamente hum dos mais estranhos que jamais se vio entre os Paises, e os idiomas de que se compoem a terra. (...) Se vós não gostaes de seres entendido quem he que vos impede que vos caleis? (...) Porque não escolheis vós outra ocupação? (...) Tendes hum grande defeito não distinguindo as cousas tristes das alegres, e dando hum mesmo tom aos Epitaphios, e aos Epithalamios. (...)
Tudo o que digo ainda que com pouca esperança, he somente para reformar o vosso estilo. (...)
Finalmente o que me parece mais acertado no caso que não queyraes emmendar o vosso estilo, he que renuncieis inteyramente a tudo o que se chama penna, tinta e papel... (...) quando leres esta Carta haveis de achar clara, distinta, e intelligivelmente, que não só vos tenho por um bom Poeta, ou por hum grande Orador, mas que tambem duvido de que sejaes hum Grammatico suportavel.
Tu genio irato, pulchrae tu nescius artis irrumpesne sacras musarum obscaenus in aedes?
Exaqui a verdade em pratos limpos."
Vienna de Austria, 2 de Novembro de 1737
(Carta LXXIX, Tomo II, pp.467/8/9/472/3/4)
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Note-se que Oliveira tinha um espírito crítico quanto ao que devia ser a literatura e a criação de um estilo próprio. Não se coíbe de dizer francamente o que pensa. Esta Carta é exemplar nesse sentido. Sobre a imitação de Gongora, que era a todos os títulos um Mestre dos poetas Barrocos ele pronuncia-se de forma contundente: "haveis de crer que há um espaço infinito entre o menos bom dos seus versos, e entre o menos máo dos vossos"...! Mesmo que não seja apreciador de Gongora e das suas filigranas, mesmo que lhe reconheça alguns versos menos bons, ele é isento quando afirma, sem receio de afrontar, que este imitador e o Poeta espanhol estão nas "antípodas."
Utiliza um discurso interrogativo, próprio de um iluminado, para o interpelar: "se não gostais de ser entendido quem é que vos impede que vos não caleis?" Pugna pela clareza do estilo e aponta os defeitos provocados pela ignorância da Arte Poética. O tom utilizado para um "Epitaphio" era o mesmo que para um "Epithalamio", não havendo distinção entre a tristeza e a alegria. Mostra-lhe a necessidade de se ouvir a música das palavras, ou então que renuncie "a tudo o que se chama penna, tinta, e papel."
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