quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Cartas Familiares de Cavaleiro de Oliveira

Sabe-se, no entanto, que o ambiente de Lisboa também tinha o outro reverso e que Cavaleiro de Oliveira viveu as aventuras próprias dos amores juvenis daquele tempo, em que o exemplo da devassidão dos costumes vinha do alto. Do rei, dos conventos, da nobreza, do clero, com, e o povo. O que o levaria a classificar Lisboa como "fermosa estrivaria". Ele mesmo contará esses namoros, "à margem dos mandamentos". A paixão pela cigana Vitorina, o amor por uma jovem judia que morreu queimada em auto-de-fé, "arrancada por assim dizer aos seus braços pelo conde de Povolide e dois esbirros da sua laia" (10), e "o seu romance com Antoninha Clara, tomada em hora de arrufo a D. António Manuel, irmão do conde de Vila Flor." (10)
Apesar disso, vai ser defensor do casamento como "primavera dos estados" e factor de "equilíbrio psicológico". Será "em vão que se procurará a apologia, ou vestígios da prática, da infidelidade conjugal (...) o Cavaleiro era no fundo um moralista, sorridente e tolerante, mas com doutrina estabelecida, embora muitas vezes olvidada." O certo é que "nenhum escritor português dissertou com tanto gosto sobre o amor humano," (11) como ele. Casará a primeira vez em 1730 com D. Ana Inês de Almeida. Deste enlace ficou-lhe um filho que mandará ir, mais tarde, para Viena.
Tudo começava a precipitar-se na sua vida quando se dá a sua primeira viuvez a 16 de Março de 1733. "Em carta de 27 de Janeiro de 1737 a Mr. De M. dizia:" (11)
«Estou obrigado em crer que há casamentos ditosos porque já o experimentei...» (11)
O que contradiz a ideia, de que este enlace foi infeliz, advogada por Aquilino no seu estudo sobre o escritor. É a sua voz e o seu coração que fala. Aqui fica.
Talvez a sua desdita tenha começado quando o pai faleceu em Viena no princípio do ano, a 9 de Janeiro de 1734, porque, ao aceitar a oferta do cargo que seu pai tinha, deixava a sua família, amigos e "nunca mais pousaria os olhos sobre a Lisboa da sua juventude." (12) Não conheceria a Lisboa do reinado de D. José I, nem o de D. Maria I, nem o desterro e condenação do Marquês de Pombal. Outro mundo espiritual e cultural, mas incerto, o esperava.
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Notas:
(10) in: Prefácio, pp.XII, Cartas, Cavaleiro de Oliveira, Selecção de Aquilino Ribeiro, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 3ª ed., 1982
(11) RODRIGUES, Gonçalves, António, O Protestante Lusitano, Estudo Biográfico e Crítico sobre Cavaleiro de Oliveira, Coimbra, MCML, pp.12.
(12) Idem, pp.13.

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