domingo, 26 de agosto de 2012

Cartas Familiares de Cavaleiro de Oliveira

Carta 3

Ao Senhor Barão de Hollembourg, a respeito das riquesas.
(...)
"O corpo he unido ao spirito, o spirito he o que somos, e os bens que a elle pertencem são aos que podemos chamar nossos propriamente. He tão grande porem a imprudencia dos homens, que buscão com mayor cuidado os bens que estão mais longe, fasendo menos caso dos que estão perto sendo estes os essenciais. Pelos bens do corpo se despresão os do spirito, e pelos da fortuna se despresão os do corpo. (...) Estima o Mundo as riquesas como se nellas consistisse o soberano dos bens.
(...) O desejo immoderado das riquesas, como diz S. Paulo, esse he verdadeyramente a causa de todos os dannos. (...) Os verdadeiros bens são aquelles que fasem bons aos que os logrão, e isto he o que as riquesas jamais fasem. (...) Assento em que as riquesas neste mundo fasem muito mais mal do que bem. (...) Não há composto mais bello que o da sabedoria com as riquesas. Assim o disia o rico e sabio Salomão: a sabedoria he boa com huma herança; porque se póde estar a coberto á sombra da sabedoria, e á sombra da riquesa. Eccles. 7. Vs.11.
As riquesas he certo que cobrem aos que as teem, porem, da mesma forma que as cascas cobrem os caracoes carregando-os. (...) Quando parecem mais seguras então fogem voando como a Aguia, diz Salomão, não havendo conselhos sabios, nem atençoens possiveis para embaraçar os seus voos em mil acidentes inopinados. (...)
O homem sabio he o único que não comprará as riquesas pelo preço que ellas se vendem. (...) A medida justa das riquesas he aquella que basta para o uso. Todas as que são superiores ao uso o não tem. Este he o preço, e esta he seriosamente a estimação que dou ás riquesas. He bem differente o que dou sempre á honra. (...) Quem não sabe viver com as que tem sendo bastante, he ignorante: Quem deseja, e trabalha por augmentar ás necessarias he desgraçado."

(Carta LXXI, Tomo II, pp. 414-15/417-8-9/420-21)

Vienna de Austria, 25 de Septembro de 1737
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"Pelos bens do corpo se desprezam os do espírito," e eles constituem a verdadeira perda do Homem que as carrega como caracóis às costas. Sábio é o que não compra as riquezas pelo preço da perda do seu Eu. A justa medida é a medida certa. É ignorante quem não sabe viver tendo o bastante, é desgraçado quem as quer superiores ao uso. A honra é para o autor a verdadeira riqueza, essa não tem preço.

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