quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Cartas Familiares de Cavaleiro de Oliveira

"O Amigo he outro eu."

Carta 1

Ao Senhor Barão de Hollembourg, a respeito da amisade.
(...)
"Sem virtude nenhuma pessoa he capaz de Amisade, e sem merecimento real não há pessoa que seja digna della. (...) Se queremos conservar por muito tempo os nossos Amigos, tomemos tambem muito tempo para fazer a sua união. O Amigo he outro eu.
(...) He preciso que façamos as Amisades em tal fórma, que possamos achar nellas a certesa do bom exemplo, as doces consolaçoens para os trabalhos, as generosas assistencias nas opressoens, sem que seja necessario pedi-las, espera-las, nem compra-las, e finalmente huma variedade infinita de gostos sempre novos, (...) se a reputação do Amigo he atacada na sua ausencia devemos defende-la. (...) A Amisade deve ser hum socorro para a virtude, e não uma companheyra para o vicio.
(...) Como creaturas pertencemos ao nosso Creador, como vassalos dependemos do Estado, e como homens devemos respeitar as nossas Familias. Nascendo desta fórma com a qualidade de Creaturas, de Vassalos, e de Parentes, contrahimos depois disso os Amigos. (...) Ainda quando já de todo está extinta, se deve conservar o respeito por huma Amisade que foi. Depois da quebra ainda há obrigaçoens a praticar, e julgo que são as mais dificultosas; porem a honra, e o nosso mesmo interesse nos devem esforçar para as cumprir. (...) Os segredos que se confiárão reciprocamente, sepultados para sempre em profundo silencio não podem ser revelados , sendo como mysterios sagrados que não he licito profanar. (...)
Ditoso o homem que póde achar hum Amigo verdadeyro, porem muito mais ditoso aquelle que he dotado das qualidades necessarias para ser fiel amigo de quem o busca."

(Carta C, Tomo II, pp. 568/71/574,577,/8)
Vienna de Austria, 27 de Dezembro de 1737
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Haverá na Literatura Portuguesa uma tão clara definição do que é ou deve ser um amigo? "O Amigo é outro eu", pressupõe que sujeito e objecto coexistem num só. A ética que está subjacente mostra-nos a grandeza dos sentimentos do autor. Ele enumera as qualidades de um verdadeiro amigo, a quem não é preciso pedir, esperar ou comprar, a ajuda necessária nos momentos difíceis. A honra exige que os segredos partilhados sejam como mistérios sagrados, que não é lícito partilhar se a amizade termina. Feliz o homem que possui um Amigo verdadeiro, conclui, mas mais ditoso é aquele que é dotado de qualidades para ser o Amigo que se procura.

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