A HUMA CAVEIRA CERCADA DE FLORES
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Com as flores a Morte! Há tal cegueira!
As flores com a Morte! Há tal loucura!
Quem fez desenganada a fermosura?
Quem fez desvanecida huma Caveira?
Que seja a tumba a casa verdadeira
Como a mesma vaidade conjectura?
Como da Parca a mísera figura
Se veste de huma gala lisonjeira?
Porem todo o espectáculo tremendo,
Porem todo o Zodíaco florido
Vay ou jà sazonando, ou corrompendo
Que muyto esteja o génio pervertido
Se o que hão de ser as flores estão vendo?
Se a Caveira está vendo o que tem sido?
A HUM BERÇO COM O FEITIO DE HUMA TUMBA
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Já he tumulo o berço, já tristeza
O que foy alegria, escuro norte
Segue a luz; & na câmara da Morte
Buscão os pulsos a vital proeza.
Já na casa da Parca a fortaleza
Dos alentos se expoem; já passaporte
Da Morte traz a vida; & desta sorte
Se vão mudando as leys da natureza.
Não se admire ninguém, traça subida
Foy do supremo Angélico conceito,
Que altamente nos animos retumba.
Porque se tão depressa passa a vida,
Quem pode duvidar, que hum proprio leito
Pode vir a ser berço, & mais ser tumba?
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(continua) pp.46
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