quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

É possível datar o Renascimento? (conclusão)

"A verdade tem um sentido ritual, mesmo na ordem do intelecto, onde a escolástica impõem vozes e meios de uma afirmação rigorosamente codificada. Inscrita dentro de um esquema providencial entre a criação do mundo e o seu fim, «A Cidade de Deus», de Santo Agostinho, serviu de protótipo escatológico e esquema regulador da cidade dos homens. O passado, o presente e o futuro são dados como prefigurador e predestinados a uma humanidade dentro de horizontes fechados e definidos.
A Renascença data e consagra essencialmente o abandono deste esquema em via de desagregação depois do século XV. O presente liberta-se das disciplinas litúrgicas que o aprisionavam. O imobilismo ontológico é rompido a partir do momento em que a Igreja perde o direito de controle universal que exercia sobre as actividades humanas. O renascimento pode ser caracterizado pela separação da cultura em relação à Igreja, assim como do poder político. As planificações teológicas não bloqueiam mais as avenidas abertas à aventura humana, à descoberta das causas e ao conhecimento da natureza íntima das forças primordiais (Francis Bacon). As novas esquematizações do espaço e do tempo permitem à época renascentista o conhecimento de um saber que, não sendo ainda o da Idade Moderna, tem características diferentes do conhecimento medieval.
A Renascença define o momento em que se torna possível uma ciência do homem que seja uma ciência humana. Porém, segundo Montaigne, que é considerado o precursor da antropologia rigorosa, o drama do homem universal é que a sua universalidade não pode ser mais que uma ambição."(9)
O encontro dos antigos livros e o saber restaurado, a imprensa, as armas de fogo, os novos continentes descobertos! Como reage o homem perante semelhantes modificações?

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Notas:

(9) - G. Gusdorf, «Les Origines des Sciences Humaines» (tradução minha de excertos da terceira parte, cap.I)

(continuação)

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