Ao terminar este trabalho, dou-me conta da imensidão de nomes de grandes homens que, ainda hoje, estão presentes através das suas obras como o melhor da nossa herança cultural universal. O período renascentista foi, sem dúvida, criativo no campo das artes, em que nos surgem pintores de nomeada, como Leonardo Da Vinci, Miguel Ângelo e Rafael. As suas obras dão-nos uma perspectiva nova que nos transmite a ideia de profundidade na pintura, assim como um realismo, patente principalmente na beleza feminina, que deixa de obedecer aos cânones religiosos para ser retratada fielmente, e já não como protótipo da Virgem.
Na música italiana sobressai também o nome de Benvenuto Cellini. Na arte da escrita surgem nomes inesquecíveis, como Francisco Rabelais (1490-1553)e Pierre Ronsard que, como escritores e poetas, criaram uma literatura nacional francesa.
No período isabelino, abandonado o latim nos actos religiosos, traduzida a Bíblia para inglês, inicia-se uma nova época de incentivo à instrução. Surgem nomes como o de Edmund Spencer, grande poeta; no campo da dramatugia, Shakespeare, Christopher Marlow e Ben Johnson, que nos deixaram obras imortais.
Contudo, por esta época, também a Península Ibérica tem dos seus maiores nomes: Lope de Vega, Cervantes («D. Quixote» é publicado em 1605); El Grego, Velasquez; sendo, por assim dizer, um período áureo no campo das artes.
Em Portugal temos Sá de Miranda, Bernardim Ribeiro, Camões, que, com «Os Lusíadas», nos dá mostras do homem cosmopolita e universal, apanágio do próprio Renascimento. Outros tantos artistas terão contribuído para o engrandecer da humanidade.
Mas este renascer foi possível graças ao empenhamento dos homens nas descobertas e aí estão, efectivamente, os Portugueses e os Espanhóes em primeiro plano. Cristovão Colombo, Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, fizeram com que a Europa tomasse consciência da existência do mundo ultramarino. Foram os descobrimentos 'uma explosão de vida', que se alia ao profundo humanismo e ao 'surto das belas artes'. Tiveram, realmente,
"os descobrimentos um papel importantíssimo na preparação dos espíritos para o acolhimento favorável da lenta teorização antropocêntrica dos humanistas."
Somado a este contributo surge não menos importante a criação da imprensa que divulgou ideias e pensamentos, antigos e novos, incutindo no homem uma confiança de condutor da natureza e do seu próprio destino. Verifica-se um intercâmbio de estudantes entre as principais universidades da época: Salamanca, Florença, Bordéus, Paris, Lovaina; mas, o que se poderá dizer é que nem sempre coincidiu este conhecer livresco humanístico com o dos homens que incentivaram as descobertas, porque a estes interessava-lhes conhecer o mar, abrir caminhos que lhes permitissem chegar às especiarias, sem o entreposto veneziano. Lisboa irá ser a grande capital do comércio renascentista. Terminava o 'império' veneziano, que detinha o monopólio do comércio.
Entretanto, é-me dado verificar que entre nós a Renascença corresponde também à entrega do Colégio das Artes à Companhia de Jesus, o que irá provocar um divórcio entre a filosofia natural, humanista aristotélica, e enveredar o ensino pela escolástica italiana e francesa, mesmo que dentro de uma corrente humanística.
Das 'lutas' religiosas surge o protestantismo de Lutero e Calvino. Inácio de Loyola havia formado a Companhia de Jesus em 1540, apoiando a Igreja de Roma. O catolicismo inicia, assim, uma verdadeira contra reforma. A acção destes missionários na empresa das descobertas foi de realce.
O conhecimento de novos produtos, como o pau Brasil, o tabaco, o acúcar, o cacau, o café, as batatas, o milho e o tomate, criaram novas necessidades e implementaram o comércio, que já não se fazia só de especiarias e de escravos, mas também dos frutos e ervas exóticas.
No campo da medicina natural também houve progressos pelo contacto com outros povos. Patente está a obra de Amato Lusitano. Da escola médica, e com influência dos naturalistas europeus do Renascimento, seria Luís Nunes de Santarém que, estudando as plantas, as daria a conhecer a André Laguna e a Amato Lusitano, que lhe ficaram a dever esse inovador trabalho de pesquisa. Conhecimentos estes que se alargaram através das notícias sobre a fauna e a flora das novas nações, e que nos transmitiram escritos como o "«Manuscrito», de Valentim Fernandes, «O Esmeraldo de Situ Orbis», de Duarte Pacheco Pereira, «A Carta de Achamento», de Pero Vaz de Caminha, o «Mundus Novus, de Américo Vespúcio, «Os Roteiros» de Vasco da Gama e de D. João de Castro; a «Notícia do Brasil», de Gabriel Soares de Sousa; «A Etiópia Oriental» de Frei João dos Santos; «A História da Província de Santa Cruz» (1576), de Pêro de Magalhães Gândavo, e de tantas outras do mesmo género,"(22) que engrandeceram a história natural e a cultura portuguesa, assim como todo o continente europeu que se ia pondo a par das descobertas.
Talvez sejam quase inumeráveis os benefícios trazidos ao conhecimento humano pelas descobertas. Porém, este período de antropocentrismo renascentista, aliado ao surto humanístico, científico e reformador de ideias religiosas, não deixou de ter também os seus lados negativos:
o aspecto da incrementação da guerra entre os povos, que o uso da pólvora e das armas mais modernas permitiu.
A escravização, que se torna legitimada, e que vai originar o protesto de teojuristas, como Victória e Las Casas, que irão legislar sobre o direito natural das gentes (base do direito moderno).
A formação da Inquisição, que leva ao primeiro Index de livros, em 1559, e que põe em perigo a ideia, que tinha sido a grande motivação da criação do Renascimento, da exaltação da liberdade do homem como ser questionador.
As grandes 'batalhas' travadas no campo das ideias e da verdade científica, iniciada por Roger Bacon dois séculos antes, que na "luta pelo direito de persistir na formulação de perguntas embaraçosas foi outro S. João Baptista que abriu, num deserto, o caminho para a Renascença,"(23) estavam a ser objecto de novas perseguições por parte do clero inquiridor.
Efectivamente, o próprio Descartes receou publicar, sabendo do processo movido contra Galileu.
Porém, o homem conseguiu que os aspectos negativos fossem suplantados pelos positivos e o resultado ficou para a posteridade como um dos maiores momentos vividos, no campo da História das Ideias, que a mente humana pode produzir.
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Notas:
(22) Silva Dias, J. S. da, «Os Descobrimentos e a Problemática Cultural do Séc. XVI», Editorial Presença, Lx, 1988.
(23)De vários colaboradores, «História do Homem nos últimos dois milhões de anos», Selecções do Reader's Digest, Lx, 1975.
Lisboa, Maio de 1990.
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