quarta-feira, 23 de maio de 2012

Salvador Correia de Sá (O Velho) -Governador do Rio de Janeiro

Quando Manuel Teles Barreto assumiu o Governo-geral, em Maio de 1583, a sua principal preocupação foi fortificar o Brasil. A segurança dos portos era primordial, porque a Espanha em guerra com a França, a Inglaterra e a Holanda sublevada, teria o Brasil cercado de inimigos, como viria a acontecer. A conquista da Paraíba, que tinha sido frustrada para Luís de Brito e Lourenço Veiga foi conseguida em 1586 e a influência dos portugueses estendeu-se ao Maranhão.
O Padre Joseph Anchieta, a quem o Brasil deve, para sempre, gratidão, falecia em 1597 e deixava, entre muitos escritos de valor, um que descreve o Rio do seu tempo, numa perspectiva geográfica, administrativa, religiosa e sócio-económica:
«O Rio de Janeiro é capitania de El-Rei tem governador sujeito ao da Baía. É Cidade intitulada de S. Sebastião, que fundou el-rei D. Sebastião, de boa memória, que ele determinava fazer muito nobre por ser de seu nome e primeira que havia fundado. Dista Do Espírito Santo 50 léguas e da Baía 180, e da Equinocial 23 graus no Trópico austral.
É porto de Mar, a cidade não mui bem assentada em um monte, mas de muito bom prospecto ao mar, tem uma baía mui formosa e ampla cheia pelo meio de muitas ilhas, não tão grandes como aprazíveis, e é a mais airosa e ampla baía que há em todo o Brasil, tem um circuito mais de 20 léguas e o porto é tão fundo que as naus mui grandes estão com a proa em terra em 14 braças.
Tem uma fortaleza cheia de muito boa artilharia, com outros três ou quatro fortes que a fazem muito defensável; terá 150 vizinhos de Portugueses e tem seu vigário com outro coadjutor somente, aqui reside de ordinário o Administrador, que é como bispo.
É terra de grandes e altissímos montes e penedias, e ao entrar da barra tem uma pedra mui larga ao modo de um pão de açúcar e assim se chama, e mais de 100 braças em alto, que é cousa admirável. Destas terras descem muitos rios caudais que se vêm despenhar e correr ao mar de duas e três léguas, e por estar debaixo do Trópico tem calores e frios quase tão rijos como em Portugal. O Inverno é mui aprazível e como Primavera na Europa, no Verão chove muito e quase cada dia; é terra rica, abastada de gados e farinhas e outros mantimentos, tem três  engenhos de açúcar; achou-se agora  nela noz moscada e pau de áquila, tão fino com o da Índia Oriental mas de mui suave olor e em tão grande quantidade que fazem os navios dele; é abundante de cedros e árvores de sândalos brancos mui finos; dão-se nela uvas, trigo e outras cousas de Portugal; de pescado é mui abundante e o clima é muito saudável.» (P.Coelho; pp.19)
Salvador Correia de Sá deixou o governo da capitania do Rio de Janeiro um ano depois, em 1598, e, por esse tempo, já Francisco de Sousa tinha para notabilizar o seu governo do Brasil, a conquista do Rio Grande do Norte. No entanto, os corsários de diversas nações atacavam os seus portos e não encontravam resistência possível que evitasse as suas destruições e rapinas. Em 1591, Thomaz Cavendish saqueou e incendiou a vila de Santos, e em 1595, outro inglês, Lencastre, com o holandês Venner atacaram o Recife, praticando o roubo e o saque durante um mês. Os colonos sentiam-se em permanente estado de insegurança e o medo assombrava o quotidiano da população em geral.
«Os limites impostos ao conhecimento, decorrentes do profundo abalo psíquico provocado pelas crises e rápidas transformações ocorridas entre os séculos XVI e XVII, tinham como causa maior o medo que, camuflado ou manifesto, estava presente em toda  a parte.» (1)
Realço este aspecto, porque apesar do Rio de Janeiro não ter sofrido saques nem Invasões desta natureza, neste período espanhol, também aqui se viveu em constante sobressalto.
«A aventura do conhecimento que se iniciara com o desenvolvimento da astronomia no início do século XVI, tinha na figura do navegador  que viajava para descobrir, arriscando a vida, o símbolo dessa experiência viva» - o medo. «O facto é que o século XVI preparou uma sociedade de mercadores, navegadores e viajantes que realizando uma grande epopeia, romperam com fantasias e profecias, desafiando a imprecisão dos dados astronómicos, em busca de uma espécie de eterno mistério dourado»(2)
Salvador Correia de Sá partiu para a corte em Agosto de 1601 e chegou a Lisboa em Outubro do ano seguinte. Desde 1598 que era administrador de minas e ambicionava conseguir "o supremo governo das minas da terra do Brasil que veio a receber." Coroava-se de glória, pois deixaria a seu filho, Martim de Sá, o governo da capitania do Rio de Janeiro que iria, por sua vez, passá-lo a seu filho, Salvador Correia de Sá e Benevides. Voltaria ao Rio em 1614, para se dedicar às Minas e ao "sertão."
Eram gerações que se sucediam e se eternizavam na memória dos vindouros pelas suas obras em prol de Portugal, do Brasil e da sua "Fortuna".
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Notas:
(1) e (2) In: FLECK,  Eliane, C. Deckmann, O Imaginário dos Séculos XVI e XVII suas Manifestações e Alterações na América, Sociedade Portuguesa de Estudos do Séc. XVIII, XI Congresso Internacional, Lisboa, 1997.
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(continua)      

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