sábado, 26 de maio de 2012

V - Salvador Correia de Sá e Benevides

«Alcaide-mor da Cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro,
Almirante da Costa do Sul e Rio da Prata,
Superintendente em Todas as Matérias de Guerra da Dita Costa,
Governador da Capitania do Rio de Janeiro,
Administrador de Todas as Minas do Brasil,
Conselheiro dos Conselhos de Guerra e Ultramarino,
Restaurador e Governador de Angola, &&&.» (*)

Os cargos exercidos por Salvador Correia de Sá e Benevides, dão-nos a dimensão do homem, do poder e da fortuna que granjeou. De certo modo intimidam, ainda hoje, quanto mais no seu tempo! Naturalmente que não podemos deixar de o ver como um herói da História de Portugal da Idade Moderna, mesmo que aos heróis, hoje como ontem, não possam deixar de ser imputadas culpas; «errare humanum est». Será, por isso, nessa perspectiva heróica do homem do século XVII, que continuaremos este trabalho, na veemente admiração desse grande feito que foi a construção do Brasil, da cidade do Rio de Janeiro e da Restauração de Angola. 
O nome de Benevides diz-nos da origem espanhola de Salvador, pois seguiu o apelido da mãe. No seu sangue corriam, aliás, várias nacionalidades, uma vez que a avó materna era inglesa, descendente de um ramo da família Bowerman, senhores do feudo de Brook na Ilha Wight, que se tinha fixado em Devon durante a primeira metade do século dezasseis, e de lá emigraram para Málaga. Segundo Boxer, um dos primos mais mais velhos dessa avó Cicely, foi presidente do conselho dos mercadores ingleses em Espanha, e um outro foi conselheiro do mesmo órgão. O seu avô materno foi governador de Cádis.
Sobre a sua família paterna dizia-se, mais tarde, quando o crepúsculo se fez sentir na sua vida, que a sua avó seria cristã nova, filha de judeus que se instalaram no Rio. No entanto, não foi devidamente esclarecido esse facto. Aquilo que o vate renascentista e grande humanista, Francisco Sá de Miranda, dizia valer no Portugal de então: - o sangue e o dinheiro -, reuniu-os Salvador Benevides, aliados a uma coragem indómita e capacidade de empreendimento, comparável à do Sá das Galés, à do capitão que comandou a armada do descobrimento de S. Tomé, à de Mem de Sá, de seus avós e pai, dos primos ingleses. Constitui um "feudo" no Rio de Janeiro de uma riqueza sem igual, e de um poder que lhe permitiu construir, ser, o "Padre eterno".
«Martim de Sá teve este filho, nascido no Rio de Janeiro no ano de 1594.» Estas são as palavras de Norton, de Lessa, e de outros autores que estudámos para escrever este texto, com as nossas e as suas palavras. Boxer aponta a data de 1602 para o seu nascimento e, o local, a cidade de Cádis. Os oito anos de diferença alteram a sua idade, no que concerne às datas em que Salvador Benevides praticou actos intrépidos.Intrigou-nos este facto, que foi esclarecido pelos documentos citados por Boxer, em que se incluem o próprio juramento de Salvador, em depoimentos que fez, no que se refere à data e local do seu nascimento. (1)
No que se refere à sua infância, também se encontram diversas contradições e poucas certezas. Os autores que pugnam como tendo nascido no Rio de Janeiro, imaginam a sua infância a estudar no Colégio da Companhia de Jesus, perto da sua casa, e a passar férias no engenho da Tijuca. Boxer diz que documentalmente não se sabe nada da infância de Salvador, além de que fez a primeira viagem ao Brasil quando tinha doze ou treze anos (2) e que foi educado durante alguns anos pelos Jesuítas, em cuja Sociedade ele estava desejoso de entrar. (3)
A idade com que foi para o Rio de Janeiro coincide com o ano de 1614, em que seu avô, Salvador Correia de Sá, regressou da sua viagem à Corte e a Lisboa. Poderemos supor que estudou em Lisboa, no Colégio de S. Antão, e viveu a primeira infância com os avós paternos, ou então, que estudou e viveu em Espanha com os avós maternos. Porém, a história não se faz de suposições e só nos podemos basear nos documentos até agora conhecidos. Esses primeiros anos não estão desvendados; os papéis ainda guardam segredos e esperam por novas pesquisas.
Sabemos que Salvador Correia de Sá e Benevides casou com D. Catarina de Ugarte Velasco, filha do vice-rei do Peru, que também teve o cargo de governador do Chile; depois de a ter conhecido quando comandou a campanha militar contra os Calchaquis, que estavam em rebelião, dirigidos por Pedro Chamay.
Esta revolta dos índios nos territórios espanhóis do Rio da Prata, principalmente na província de Tucuman, preocupou o rei Filipe III que escolheu Salvador para resolver a contenda. O cabecilha desta guerra foi preso em 1634, com a tomada da povoação de Singuil e a vitória final decidiu-se na batalha de Palingarta. A ordem voltou ao Paraguai. Recheada de emboscadas, numa situação territorial difícil, foi uma guerra que granjeou louros para Sá e Benevides, pois chegou a ser ferido com "numerosas frechadas".(4) Filipe IV viria a nomeá-lo Governador e capitão-general da capitania do Rio de Janeiro.
Este casamento, pelo seu dote, enriqueceria o já tão vasto património de Salvador em domínios, tesouros, poder e nobreza. D. Catarina descendia de fidalgos que há muitos anos serviam na América do Sul. Desde 1561 a 1564 que um seu antepassado tinha sido o 4º vice-rei, D. Diego Lopes e Velasco, conde de Nieva. Mais tarde, de 1596 a 1604, outro dos seus familiares, D. Luís Velasco, também foi vice-rei no "velho país dos Incas." às glórias dos antepassados da família dos Sás, juntavam-se outras, destas egrégias gerações.
Mais tarde, no Brasão de Armas do Visconde de Asseca, iriam figurar as armas dos Correias, dos Sás, Benevides e Velascos. 
Deste consórcio nasceram «Martim Correia de Sá, João Correia de Sá, Salvador Correia de Sá (que foi Chantre da Sé de Lisboa e morreu moço), Sebastião de Sá, jesuíta, e Teresa Velasco, mulher de Luís da Silva Telles, (depois freira de Santo Alberto).» Salvador Correia de Sá e Benevides teve uma outra filha, com "uma moça parda," que se chamou Joana Correia de Sá e Benevides. (Alencastro, pp. 365)
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Notas:
(*) In: Norton, pp.23
(1) Torre do Tombo, Habilitações da Ordem de Cristo, carta 8, maço 4; "consulta da mesa de consciência e ordens", 6 de Abril de 1644; AHU, Lisboa, cod. 253, "Lº1 das consultas da Bahia", fol. 43 ff.; relatório de Salvador para o Conselho Ultramarino de 3 de Maio de 1677.
(2) Relatório de Salvador, de 3 de maio de 1677, publicado em «Revista trimensal», LXIII, (1901),pp.5-13
(3) Carta de Salvador, de 2 de Junho de 1643, para o geral jesuíta, publicada in: Leite, História, pp. 423-4
(4) SAMPAIO, Albino Forjaz de , Salvador Correia de Sá e Benevides, O Restaurador de Angola, Lx, editora Ática, 1936, pp.8.
       

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