A. Garrett
DE GARRETT AOS NOSSOS DIAS
O século XIX teatral abre com Garrett, diz Duarte Ivo Cruz. Efectivamente, o que podemos constactar, através do livro que nos serviu de guia, é que mesmo aquelas peças que foram representadas, quer as dos Arcades, quer as do Teatro de Cordel, não vincularam os nomes dos seus autores para a posteridade e ficaram irremediavelmente sepultadas no mau final do séc. XVIII, no péssimo princípio do séc. XIX.
Falar do teatro português do séc. XIX, é como falar da fénix das cinzas renascida, após um longo sono letárgico. Certamente que poderemos sumariar peças teatrais e autores de merecido mérito de Gil Vicente a Garrett; contudo, Gil Vicente marcou uma época esplendorosa e criadora do teatro português.
Garrett irá, de certo modo, fazer renascer esse esplendor e marcar o teatro não só através dessa obra prima, que é a sua peça Frei Luís de Sousa, mas principalmente porque foi o verdadeiro criador de uma escola de teatro, e, por fim, através de todas as vicissitudes, um Teatro Nacional que ainda hoje nos honra, assim como o seu nome.
Garrett "apontou os caminhos do futuro (...) marcou em todos os domínios uma atitude de meio termo exemplar: na política, entre a liberdade e a ordem, renovação e tradição. Equilíbrio na cultura entre a arte pura e a arte comprometida, entre o popularismo e a aristocracia mental, entre o nacionalizar e abrir Portugal às correntes da cultura europeia, entre idealismo e atenção ao real, entre espontâneidade e apuro estético." (1) Este meio termo, estas características, são, quanto a mim, a "mola real" de toda a sua vida e obra; "adivinhava em todas as formas de arte, incluindo a literatura, a mesma realidade essencial, - à epopeia corresponderia a arquitectura, à tragédia a estatuária, e defendia a ideia de que as artes plásticas, a música, a literatura de cada época exprimem o mesmo espírito, o mesmo estilo de vida e pensamento." (2)
Não admira, portanto, que Duarte Ivo Cruz escreva que o séc. XIX do teatro português é Garrett, e que se deu a vivência de "um período de entrosamento dramatúrgico e político-económico (...) de mudanças sociais, com relevo basilar do liberalismo, fenómeno portuguesmente romântico (...) e de decisiva modernidade". Garrett viveu 55 anos de uma vida plena e de "uma extraordinária, ímpar personalidade. (...) Foi um dos raros renovadores, em todos os sentidos, do teatro português. Como dramaturgo, surge-nos o primeiro e o último dos verdadeiros românticos; (...) como organizador, criou uma infrastrutura cénica que ainda hoje subsiste."
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Notas:
(1) - (2) - Prado Coelho, Jacinto, Dicionário de Literatura, II Vol., pp. 364/365, Editora Figueirinhas, Porto, 1985.
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