terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O Cinema Português

Teria sido Aurélio da Paz dos Reis que, segundo A. Videira Santos, iniciou, no Porto "A História do Cinema Português", em 12 de Novembro de 1896. Esta data marca a primeira sessão comercial, "no Príncipe Real", com películas de motivos portugueses - foram eles o jogo do pau (Santo Tirso), saída do pessoal operário da fábrica Confiança, chegada de um combóio americano a Cadouços, o Zé Pereira na romaria de Santo Tirso, a feira de São Bento, A Rua do Ouro (Lisboa) e Marinha - filmados por este fotógrafo distinto, que possuía uma máquina de "projecções luminosas", a que chamou o Kinetógrafo português.
Porém, o cinema ter-se-ia iniciado em Portugal, com a amostra das primeiras imagens, em Março de 1895, (...) com o animatógrafo, de Edwin Rousby." Paz dos Reis ter-se-ia apaixonado pelo espectáculo quando este foi projectado no Porto. A propósito, diz o Dr. Félix Ribeiro: "...Não perdeu uma única sessão depois de ter assistido à estreia (...); a partir desse momento, a sua preocupação dominante (...) passou a ser o estar na posse e poder manejar um tal aparelho."
Manuel Maria da Costa Veiga terá sido o pioneiro do cinema em Lisboa; ele próprio "ajudou Edwin Rousby no espectáculo do Real Coliseu"; ..."no verão de 1899 (...) exibe o seu primeiro trabalho: Aspectos da Praia de Cascais", onde aparecia filmado o próprio rei D. Carlos e sua família, que ali se encontrava em veraneio. Teria sido um repórter das actualidades nacionais, com a sua câmara Urban, durante uma década.
João Freire Correia (também fotógrafo, como Aurélio dos Reis) foi um outro pioneiro de Lisboa, que obteve sucesso com o seu filme «Os Crimes de Diogo Alves», realizado de parceria com Manuel Cardoso, pois ambos tinham fundado a "Portugália Filme" (1909). Filmaram juntos "dezenas de documentários e reportagens". Planos, projectos, sonhos e mais sonhos ficaram sem concretização, mas o cinema português estava vivo e iria continuar. Júlio Costa é também um percursor e funda "em 1910 a Empresa Cinematográfica Ideal. Ele próprio era proprietário do mais antigo cinema de Lisboa, o Salão Ideal". Com este homem empreendedor, iniciou a sua carreira o actor mais querido, António Silva, com um pequeno papel no romance, transposto para a tela, de "D. Pedro e D. Inês de Castro". Este filme obteve grande êxito.
Antecedia este filme, a "Inês de Castro", de Leitão de Barros (1945); mas, efectivamente, será Leitão de Barros que, após sete anos do incêndio que vitimou os estúdios de Júlio Costa (1911), irá fundar a Lusitânia Filme, juntamente com Celestino Soares e Luís Reis Santos. Vivia-se já em plena primeira guerra mundial, e, em Portugal, o governo de Sidónio Pais. Esta proclamação do Presidente da República viria a ser filmada por Leitão de Barros em 5 de Maio de 1918. O Chefe de Estado é aclamado quando, na janela do edifício da Câmara Municipal, assim como é filmada também a sua revista às tropas da guarnição de Lisboa, na Praça dos Restauradores. Mas este não foi o seu primeiro filme, pois, mesmo antes de concluído o estúdio, Leitão de Barros filma no exterior duas curtas-metragens: «Malmequer» e «Mal de Espanha», que, segundo Luís de Pina, "logo a maledicência lisboeta aproveitou para criticar; (...) a produção da Lusitânia começa mal..." Sátira de costumes, este último filme é realizado na praia do Lagoal, em Caxias, para a qual ia a burguesia endinheirada da capital. A paixão "proíbida" pela artista espanhola, os ciúmes da esposa, ilustram esta comédia. «Malmequer», também de 1918, já antecipa "o seu gosto pelas evocações históricas, românticas e espectaculares, passado no palaciano e frívolo século XVIII lisboeta".
Aproveitando os jardins do Palácio de Queluz (como viria a fazer em «A Severa» e «Bocage»), Leitão de Barros fez um filme leve e elegante como o espírito da época, quase sem enredo, uma verdadeira sucessão de quadros, que daria razão a um dito seu, anos mais tarde: "faço filmes para pendurar..." Talvez a sua vocação para apintura se complementasse com o cinema. Neste filme surgem Robles Monteiro e Alda Aguiar, actores de teatro, que eram transpostos para o celulóide. É ainda Luís de Pina que conta: "as intrigas perversas e a frágil organização do nosso show business acabaram também com o sonho da Lusitânia Filme (...) o mais ambicioso projecto (...) 'O Homem dos Olhos Tortos' (...) não chegou a concretizar-se totalmente por insuperáveis dificuldades financeiras."
Efectivamente, este é um dilema do passado como do presente. verificámos ao longo de toda a nossa vida e história, quer seja do teatro, quer seja do cinema, ou em qualquer outro campo artístico (a música, a dança, a pintura, etc.), que, em Portugal, dinheiro para os empreendimentos culturais não abunda. Mecenas, talvez precisemos de mecenas. Mas, para isso, era necessário que os homens de dinheiro amassem as artes e, para as amar, é preciso conhecê-las, sentí-las, vibrar com paixão para acreditar e aceitar em investir. Para quando? Mas não é a esperança a última a desfalecer? Por isso, houve muitos mais pioneiros que acreditaram e tentaram o cinema, mesmo que soubessem que iam ficar pelo caminho. Porém, ousar era preciso. Norton de Matos criou, por esta altura, os Serviços Cinematográficos do Exército, aquando titular da pasta do Ministério da Guerra.
"Outros viriam, dez anos depois, renovar o cinema português." E é no encalço destes homens que eu continuo através da história do cinema e passo para a década de 30 e 40.

(continua)

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