O mesmo aconteceu a Evaristo que, quando regressou a Paris, a peça tinha caído.Pois é ; não era de Shakespeare compreende-se tal fim! Mas também leitor, Mariana, não era Desdêmona porque, essa sim, morreu inocente e era mulher de um só amor.
Mariana casou por paixão, mas o tempo é um grande castigador, pôs a estima e a apatia no dia a dia do casal (onde havia de existir conquista, ternura, mútuo namorar), e eis que surge Evaristo, por quem Mariana se apaixonou, e que paixão! Promessas são feitas, era um amor verdadeiro. O que havia de acontecer! Contudo seu marido ausentara-se e não sabia de nada. Havia que manter as aparências, pois Mariana desejava manter o casamento. Sua mãe força de personagem caracter, intervém e põe fim aquele adultério, que era preciso esconder a bem do visual social! Evaristo, o mais que fez foi ir-se embora para Paris. Coragem lhe faltou para lutar por esse amor que pretendeu. Tinham já passado dezoito anos quando Evaristo, movido pelas notícias da revolução, decide regressar ao Rio de Janeiro. Com o regresso, as lembranças envolvem Evaristo. Ele sim, não a tinha esquecido. Vai visitá-la e no quadro da sala revê aquela que tinha sido a sua Mariana, que ternamente desceu daquela moldura (grade do tempo que nos prende), e pousou a cabeça em seus joelhos, enlaçaram as mãos; que bom que era! O seu coração revivia, era necessário decretar a paragem dos relógios: Todos os relojoeiros deveriam aprender outra profissão. Mas não! Nada disso era possível, porque dentro do coração de Mariana a flor do amor havia "desbotado" com o tempo. Ela agora, sincera como das outras duas vezes, chorava Xavier, que partira desta vez para uma viagem sem regresso.
Mas regressar a Evaristo, Mariana não desejava. Ainda jovem, mesmo quando perto das mais frescas rosas, pois ela pertencera àquela geração dos belos cedros, não queria recomeçar de novo. Fez de conta que o não viu, e Evaristo o que fez novamente foi voltar a Paris e correr ao Odéon, reviver a sua paixão pelo teatro, mas desta vez não assistiu, pois a peça, tal como o amor, não perdurou.
Isto de peças que caem e outras que ficam, traz-me à memória a infância e em, como é logo aí que nos iniciamos nesta peça de teatro, que é a própria vida, que põe em cena a delacção e a corrupção.
Sabe o leitor que assim é; paixões são vividas todos os anos nos bancos da escola, uma caem, outras jamais esquecem. Foi o que aconteceu ao Pilar, que nesse dia escreveu para sempre o seu Conto de Escola, pois jamais o esqueceu . Raimundo, filho do mestre-escola, disse-lhe baixinho: se você me ajudar nos deveres escolares, eu lhe dou esta moedinha de prata. (Nesse dia , em vez de ir brincar para o morro ou para o campo, Pilar se resolvera pela escola, com medo das sovas do pai, que eram de não esquecer), Pilar era o mais adiantado da classe e não teria dificuldade em ajudá-lo. Afinal aquela pratinha era do tempo do rei e vivia-se agora no fim da Regência. Pilar desejava a moedinha e propôs-se ajudá-lo. Porém os olhos inquiridores de Curvelo observaram e este colega mais velho não resistiu e foi fazer queixa ao Mestre (que nesse dia nem prestava tanta atenção à leitura do jornal como era seu costume). O céu azul lá fora era uma tentação, o seu coração ansiava que acabasse a lição! Porém, de repente, o Mestre chamou! E eis que o castigo chegou! Dinheiro por ensinar a sintaxe? Entregue já essa moeda! Seu coração hesitou, mas por fim lá a entregou. Viu-a rolar pelo chão, e nem o pedido de perdão, a humilhação de serem acusados de vilania, os impediu de levarem doze valentes reguadas. Apanharam para que não esquecessem a lição! No dia seguinte, Pilar levantou-se cedinho e a sua ideia era ir procurar a moedinha. Levava umas calças novas, e a intenção era ir para a escola, mas sentindo o rufar do tambor dos fuzileiros eis que as suas pernas o encaminham sempre atrás da música dos tambores. Acabou a manhã na praia e, dormindo, sonhou que o seu pai não mais lhe batia, e o amava, era só carinhos e que a moedinha de prata era agora uma linda e cumprida agulha que discutia a sua importância com um novelo de linha.
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